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A casta dos superbacharéis



A casta dos superbacharéis*

WILSON JOSÉ VIEIRA
Engenheiro nuclear,Ph.D.

Participo de uma lista de discussão na internet 
(bolsa_produtividade@googlegroups.com) que tem discutido a utilização de 
critérios quantitativos para concessão de auxílios financeiros, de bolsas de 
produtividade e para avaliação de projetos pelas agências de fomento de C&T. 
O denominador comum é que todos acreditam que o mérito das propostas 
submetidas aos órgãos de fomento não é devidamente contemplado.

Não há dúvidas sobre o excelente trabalho que fizeram, e que ainda fazem, o 
CNPq, a Capes e a Fapesp, por exemplo. Todos sabem que a pós-graduação no 
Brasil é um grande sucesso. No entanto, a procura de pesquisadores e 
professores por melhores currículos é fomentada principalmente pela 
supervalorização do número de publicações, especialmente, publicações 
internacionais, o que chamamos de corrida pelo ?currículo por metro?.

Com inúmeras exceções, a corrida pelo currículo/m está concentrando as 
pesquisas nas linhas mais publicáveis em detrimento daquelas de maior 
necessidade do país. Alguns pesquisadores e professores admitem que 
concentram seus esforços na redação de várias publicações similares 
(autoplágio), fatiam suas pesquisas em vários artigos apenas para aumentar o 
número, participam de clube de autores que multiplica o número de 
publicações de cada um, editam periódicos veículos da próprias publicações, 
evitam pesquisas que demandem tempo ou grandes experimentos, abraçam linhas 
de pesquisa do exterior com maiores facilidades de publicação; evitam 
publicar na língua portuguesa; evitam publicar em congressos e revistas 
nacionais; participam da ciranda dos índices de citação e escolhem 
orientados com maiores chances de publicarem rapidamente.

Tudo isso os distanciam ainda mais da sociedade brasileira e da atividade 
econômica nacional. E fazem com que percam oportunidades de descobrir coisas 
realmente novas e que mereceriam o reconhecimento das comunidades nacional e 
internacional de C&T. Está-se criando no país uma casta de superbacharéis.

O resultado da discussão é um manifesto pedindo às instituições de fomento 
que estudem maneiras de melhorar os critérios de avaliação de pedidos, 
projetos e propostas em C&T. Principalmente, que incluam o mérito. Por 
exemplo: por que não criar bolsa de produtividade científica, bolsa de 
produtividade tecnológica, bolsa de produtividade acadêmica, bolsa de mérito 
científico, bolsa de mérito tecnológico, bolsa de mérito acadêmico? É 
preciso valorizar cada área e cada atividade. Não é possível essa tábua rasa 
que coloca pós-graduação, ciência, tecnologia, educação e pesquisa medidas 
pelos mesmos critérios.

Para considerar o mérito de uma proposta em C&T, penso que os avaliadores 
devem se perguntar: É realmente uma contribuição à ciência? Trará maiores e 
melhores conhecimentos teóricos? Ou ainda, de um ponto de vista mais 
aplicado: é de interesse para o país, para a região? Gera emprego? Substitui 
importações? Salva vidas? Aumenta a eficiência? Promove a integração do 
país? Fortalece nossos mercados? Protege o meio ambiente? Aumenta a 
qualidade de vida? Diminui a poluição? Aumenta a produtividade? Diminui o 
custo de produção? Se questões como essas não forem consideradas, não 
conseguiremos transformar ciência em tecnologia, ou, mais claramente, 
educação em riqueza. A facilidade do julgamento de propostas com base no 
tamanho do currículo não poderia ser a principal razão para não se 
considerar o mérito de uma proposta.

Somos bons em ciência, temos excelentes universidades e laboratórios 
nacionais. Temos núcleos de excelência em várias áreas do conhecimento, mas 
não se pode perseguir apenas a meta de alcançar nível sete da capes. 
Qualquer programa de pósgraduação deveria, em primeiro lugar, realizar o que 
tem de maior mérito. Qualquer pesquisador ou professor poderia propor 
pesquisas de grande mérito, publicá-las e ter um currículo reconhecido. Mas 
se a única coisa a valorar for o tamanho do currículo, ele vai publicar um 
monte de obviedades inúteis enquanto suas idéias mais originais e mais 
necessárias talvez sejam esquecidas ou desenvolvidas no Primeiro Mundo.

Outra consequência é o inchamento das grandes universidades que absorvem a 
maioria dos recursos que poderiam ser utilizados para o desenvolvimento de 
outros polos regionais de C&T no Brasil. Isso, sim, criaria postos de 
trabalho qualificados e espalharia qualidade de vida pelo país como um todo.

*Publicado no Correio Braziliense em 7 de fevereiro de 2009

Prof. Luis Paulo
C.P. 2386
20001-970 Rio de Janeiro, RJ

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