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A casta dos superbacharéis
- Subject: A casta dos superbacharéis
- From: "Luis Paulo Vieira Braga" <lpbraga@im.ufrj.br>
- Date: Thu, 12 Feb 2009 21:14:34 -0300
A casta dos superbacharéis*
WILSON JOSÉ VIEIRA
Engenheiro nuclear,Ph.D.
Participo de uma lista de discussão na internet
(bolsa_produtividade@googlegroups.com) que tem discutido a utilização de
critérios quantitativos para concessão de auxílios financeiros, de bolsas de
produtividade e para avaliação de projetos pelas agências de fomento de C&T.
O denominador comum é que todos acreditam que o mérito das propostas
submetidas aos órgãos de fomento não é devidamente contemplado.
Não há dúvidas sobre o excelente trabalho que fizeram, e que ainda fazem, o
CNPq, a Capes e a Fapesp, por exemplo. Todos sabem que a pós-graduação no
Brasil é um grande sucesso. No entanto, a procura de pesquisadores e
professores por melhores currículos é fomentada principalmente pela
supervalorização do número de publicações, especialmente, publicações
internacionais, o que chamamos de corrida pelo ?currículo por metro?.
Com inúmeras exceções, a corrida pelo currículo/m está concentrando as
pesquisas nas linhas mais publicáveis em detrimento daquelas de maior
necessidade do país. Alguns pesquisadores e professores admitem que
concentram seus esforços na redação de várias publicações similares
(autoplágio), fatiam suas pesquisas em vários artigos apenas para aumentar o
número, participam de clube de autores que multiplica o número de
publicações de cada um, editam periódicos veículos da próprias publicações,
evitam pesquisas que demandem tempo ou grandes experimentos, abraçam linhas
de pesquisa do exterior com maiores facilidades de publicação; evitam
publicar na língua portuguesa; evitam publicar em congressos e revistas
nacionais; participam da ciranda dos índices de citação e escolhem
orientados com maiores chances de publicarem rapidamente.
Tudo isso os distanciam ainda mais da sociedade brasileira e da atividade
econômica nacional. E fazem com que percam oportunidades de descobrir coisas
realmente novas e que mereceriam o reconhecimento das comunidades nacional e
internacional de C&T. Está-se criando no país uma casta de superbacharéis.
O resultado da discussão é um manifesto pedindo às instituições de fomento
que estudem maneiras de melhorar os critérios de avaliação de pedidos,
projetos e propostas em C&T. Principalmente, que incluam o mérito. Por
exemplo: por que não criar bolsa de produtividade científica, bolsa de
produtividade tecnológica, bolsa de produtividade acadêmica, bolsa de mérito
científico, bolsa de mérito tecnológico, bolsa de mérito acadêmico? É
preciso valorizar cada área e cada atividade. Não é possível essa tábua rasa
que coloca pós-graduação, ciência, tecnologia, educação e pesquisa medidas
pelos mesmos critérios.
Para considerar o mérito de uma proposta em C&T, penso que os avaliadores
devem se perguntar: É realmente uma contribuição à ciência? Trará maiores e
melhores conhecimentos teóricos? Ou ainda, de um ponto de vista mais
aplicado: é de interesse para o país, para a região? Gera emprego? Substitui
importações? Salva vidas? Aumenta a eficiência? Promove a integração do
país? Fortalece nossos mercados? Protege o meio ambiente? Aumenta a
qualidade de vida? Diminui a poluição? Aumenta a produtividade? Diminui o
custo de produção? Se questões como essas não forem consideradas, não
conseguiremos transformar ciência em tecnologia, ou, mais claramente,
educação em riqueza. A facilidade do julgamento de propostas com base no
tamanho do currículo não poderia ser a principal razão para não se
considerar o mérito de uma proposta.
Somos bons em ciência, temos excelentes universidades e laboratórios
nacionais. Temos núcleos de excelência em várias áreas do conhecimento, mas
não se pode perseguir apenas a meta de alcançar nível sete da capes.
Qualquer programa de pósgraduação deveria, em primeiro lugar, realizar o que
tem de maior mérito. Qualquer pesquisador ou professor poderia propor
pesquisas de grande mérito, publicá-las e ter um currículo reconhecido. Mas
se a única coisa a valorar for o tamanho do currículo, ele vai publicar um
monte de obviedades inúteis enquanto suas idéias mais originais e mais
necessárias talvez sejam esquecidas ou desenvolvidas no Primeiro Mundo.
Outra consequência é o inchamento das grandes universidades que absorvem a
maioria dos recursos que poderiam ser utilizados para o desenvolvimento de
outros polos regionais de C&T no Brasil. Isso, sim, criaria postos de
trabalho qualificados e espalharia qualidade de vida pelo país como um todo.
*Publicado no Correio Braziliense em 7 de fevereiro de 2009
Prof. Luis Paulo
C.P. 2386
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