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dia do livro, exceto...
- Subject: dia do livro, exceto...
- From: "Luis Paulo Vieira Braga" <lpbraga@im.ufrj.br>
- Date: Fri, 23 Apr 2010 14:22:07 -0300
Livros fora !
Luis Paulo Vieira Braga
No documento da área de avaliação Matemática, Probabilidade e Estatística da
CAPES, a coordenação deixa bem claro que livros estão fora: ?A Matemática,
Probabilidade e Estatística não utiliza Qualis de livros, por não ser este
um veículo prioritário para a produção da Área.? Como se sabe a avaliação é
feita exclusivamente sobre artigos publicados em periódicos de uma lista
denominada Qualis na qual se ordenam as revistas científicas por categorias
de importância. Mas não é sobre o Qualis de revistas que desejo refletir, e
sim sobre a exclusão da produção intelectual sob a forma de livros da
avaliação dos cursos de pós-graduação e suas conseqüências. Vou focalizar
especialmente a área de estatística sobre a qual disponho de mais
informações.
O cotidiano de um professor pesquisador ou de um pesquisador em dedicação
exclusiva no Brasil não se parece em nada com o paraíso descrito no prólogo
do livro de Lindley de 2006 ? Entendendo a Incerteza ? publicado pela
Wiley: ?Não me lembro de ter me perguntado, ou de ter sido perguntado por
outrem, se o que fazia como pesquisador era justificável. A sociedade me
paga um salário que me permite ter uma vida confortável para mim e minha
família, proporcionando-me tempo suficiente para pensar e escrever, sendo
apreciado pelas poucas pessoas que se deram ao trabalho de ler minhas
conclusões?. Tempo e dinheiro são exatamente os elementos que mais faltam a
quase todos aqueles que se dedicam à carreira acadêmica no Brasil. Digo
quase todos, porque obviamente estou excluindo os carreiristas e os
oportunistas que infelizmente existem em todas as profissões. As exigências
para um pesquisador se manter nas folhas de pagamento dos órgãos
financiadores são cada vez mais árduas, principalmente para jovens
pesquisadores fora das principais cidades do país. O foco na publicação em
revistas de alta qualidade de circulação internacional é em parte
justificável, mas do modo como está sendo feita, está tornando a existência
de periódicos nacionais muito difícil. Alguns deixam de existir, outros se
associam a entidades internacionais para sobreviver. Nada contra a
cooperação internacional no domínio da ciência ou da cultura, ela é
particularmente preciosa em momentos de autoritarismo de direita ou de
esquerda. Falo ainda (pela última vez) dos periódicos, apesar da promessa
inicial, para realçar que o mesmo efeito está se dando no caso dos livros.
Percorrendo o programa de disciplinas de alguns bacharelados em estatística
nota-se que à medida que se avança no programa do curso, autores nacionais
cedem lugar aos estrangeiros. No caso da estatística, publicações de
minicursos no SINAPE e no Colóquio não se tornaram livros no sentido
estrito - baixa tiragem, não têm isbn, raramente são reeditados. A
iniciativa da Associação Brasileira de Estatística (ABE) com o Projeto
Fisher em 2004 foi exatamente para suprir essa deficiência. Entretanto,
desde então só se publicaram três livros. Não acredito que isso esteja
ocorrendo por causa da globalização. Há mercado para livros texto em
português e há os recursos humanos e materiais para produzi-los. No entanto,
à medida que o tempo é escasso e livros estão fora da carreira acadêmica
segundo a CAPES, por quê escrevê-los? Ora exatamente os profissionais, que
estão em contacto com a fronteira da pesquisa, são os mais indicadas para
produzirem livros para as disciplinas mais avançadas nos bacharelados. Mas
se o fizerem, correm o risco de não produzir artigos, esses sim que contam
para a carreira.
Evidentemente a introdução do item livros deve ser cercada de cuidados,
exigir conselho editorial de qualidade, editora de âmbito nacional, e outros
critérios que salvaguardariam a seriedade da produção. Renato Janine
Ribeiro, ex-diretor de avaliação da CAPES, chegou a manifestar a necessidade
de estruturar um Qualis livro, mas, pelo menos na Área de Matemática e
Estatística a idéia não prosperou. Enquanto isso não ocorrer os livros estão
fora!
Prof. Luis Paulo
C.P. 2386
20001-970 Rio de Janeiro, RJ
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