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Deu na Folha de São Paulo
- Subject: Deu na Folha de São Paulo
- From: Francisco Cribari <cribari@gmail.com>
- Date: Mon, 15 Aug 2011 08:09:57 -0300
Folha de São Paulo, 15 de agosto de 2011
A vez dos artigos
Publicar em revistas científicas pesa tanto que já substitui as teses em cursos de pós-graduação
SABINE RIGHETTI
DE SÃO PAULO
Os periódicos científicos,
onde pesquisadores publicam seus estudos, têm ganhado em importância. A tal
ponto que, no Brasil, seguindo países como Holanda e
EUA, alguns programas de
pós-graduação já substituem
a obrigação de escrever uma
tese por artigos científicos.
O aluno pode defender,
em banca, três trabalhos publicados ou aceitos para publicação em revistas científicas. Pelo menos dois deles
devem estar em periódicos
de "alto impacto", ou seja,
aqueles que são muito citados por pesquisadores.
A substituição da tese pelos artigos é feita com aval da
Capes (Coordenadoria de
Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior), que avalia a pós-graduação no país.
No Instituto de Biociências
da USP, por exemplo, os alunos podem escolher entre a
tese "padrão" ou os artigos.
"Ninguém lê tese, a não
ser os membros da banca. Se
o trabalho não for publicado,
vai ficar jogado numa biblioteca", diz a geneticista Mayana Zatz, uma das entusiastas
do formato. "Juntar papers já
publicados é o melhor que
pode ser feito. Na Holanda,
eles já fazem isto há muito
tempo", afirma.
"A publicação prévia é importante, mas não podemos
deixar nas mãos das revistas
a titulação dos alunos. A defesa da tese tem de ser mantida", alerta Rogério Meneghini, coordenador científico do
Projeto SciELO, que reúne
publicações da América Latina com acesso livre.
Além de disseminar as informações acadêmicas mais
facilmente, os artigos dão
mais visibilidade à produção
científica do país. Hoje, o
Brasil está em 13º lugar no
mundo em quantidade de artigos publicados.
MAIS RANKINGS
Mas os artigos não podem
ser publicados em quaisquer
revistas. Gestores têm criado
rankings de periódicos para
classificá-las.
No Brasil, o Qualis, da Capes, cumpre esse papel e
classifica, por área de conhecimento, cerca de 17 mil títulos. Quem publicar mais nos
melhores periódicos, ganha
nota mais alta. E quem tiver
as notas mais altas, recebe
mais recursos, como bolsas.
A ligação direta entre a publicação de artigos e distribuição do dinheiro público
para ciência tem tirado o sono dos pesquisadores, principalmente daqueles cujas
revistas correspondentes à
sua área não estão no topo.
"No meu campo de
estudo, administração de empresas, o
ranking não reflete a
realidade", diz Ross
Thomas, editor do
"Journal of Educational Administration" e
professor da Universidade de
Wollongong, na Austrália.
Naquele país, o governo
distribui R$ 2,8 bilhões para
pesquisas de acordo com a
"qualidade" da revista em
que os trabalhos são publicados. Como não ocupa os primeiros lugares no ranking,
que reúne 22 mil revistas do
país, a área de Thomas fica
com uma fatia pequena.
É isso também que acontece com as ciências humanas,
cuja produção aparece mais
em livros do que nas revistas.
"É preciso adequar a metodologia [de avaliação] para
essa área", diz Isidro Aguillo,
do Laboratório Cybermetrics,
do CSIC (Conselho Nacional
de Pesquisa da Espanha).
A distribuição de recursos
de acordo com as áreas que
mais publicam causa o que a
sociologia da ciência chama
"efeito Mateus". O nome é
uma alusão à passagem bíblica que diz "a quem tudo
tem, tudo lhe será dado".
"Quem mais publica artigos continua recebendo mais
recursos", diz Maria Conceição da Costa, socióloga da
ciência da Unicamp.