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Para não dizer que não falei dos espinhos



Para não dizer que não falei dos espinhos

"Vós investigadores, não deveis confiar que, apenas pelo emprego da imaginação, se fazem intérpretes entre a natureza e o homem, mas somente naqueles que exercitam seu intelecto com os resultados de experimentos."
Leonardo da Vinci

Este texto está na entrada do CIPE do AC Camargo, até recentemente dirigido pelo cientista e amigo Dr. Ricardo Enzo Brentani, falecido na última semana de novembro. Já tenho saudades dos ensinamentos que dele recebi neste ultimo ano, quando conheci o mestre.

Minha aflição, no entanto, foi em parte superada quando o André, meu filho, trouxe o filme de meu neto ainda na barriga de minha nora. Vimo-lo mover a boca e os braços até cobrir com a mão sua boca. É algo incrível a tecnologia atual, não só nos laboratórios de DNA do mestre Brentani, mas também no nosso dia a dia.

Mas na verdade escrevo por outros motivos. Tenho notado que, além de colegas que admiro tendo nos dado a honra de ler nosso trabalho sobre significância Bayesiana, muitas vezes se incomodam quando pensam que tudo já havia sido descrito na literatura por estatísticos importantes. Às vezes ficava eu indignado com a aparência de tentativa de desmerecimento de nosso trabalho. Contudo só tenho a agradecer o grande serviço que nos fazem esses colegas. Esse meu sentimento negativo, posso dizer equivocado, deve-se ao fato de ouvir, de gente que respeito, um pouco da tentativa de desmerecer ou ridicularizar nosso trabalho com o método bayesiano, do qual fazemos uso com sucesso, creio, desde os idos de 1970. Quero assim me desculpar com aqueles colegas que se dedicaram ao nosso trabalho de significância, fato que nos fez ver o grande serviço que nos prestaram.

Passo agora para uma descrição do que aprendi com minhas leituras. Li com cuidado o artigo de Box & Tiao (1965) ? The Annals of Statistics 36(5):1468-82 ?, um trabalho exaustivo sobre a construção de conjuntos multivariados de credibilidade. A maior parte deste trabalho é dedicada à construção de distribuições posteriores marginais ao grupo de parâmetros de interesse. Embora sejam avaliadas probabilidades de o conjunto de credibilidade ser limitado pelas observações, à comparação imediata com a credibilidade, na maioria das vezes 95%, é feita para se testar a hipótese. Outro fato relevante é que ali só se falam praticamente de distribuições assintóticas quando o modelo não fosse normal. O nosso e-value, a Bayesian significance índex, é calculado no espaço paramétrico original em toda sua dimensionalidade. Para que seja medida possibilística, satisfazendo ótimas propriedades, a dimensionalidade original tem de ser mantida. Mas essa não é a grande vantagem de nosso e-value. Nossa medida é invariante por transformações gerais e não só lineares: a falta de invariância pelos métodos concorrentes é a grande restrição da comunidade ao trabalho de Box & Tiao. O livro do Zelner também não trata do método que utilizamos e desenvolvemos.

Ganhei de presente esta semana o Livro do Mike West com o Harison e como nos foi informado por alguns colegas, nosso trabalho já estava lá publicado. Caros creiam, falavam sobre o mesmo problema de Box & Tiao. Mas se não pensarmos no elemento surpresa de IJ Good, que faz nosso trabalho ser invariante, WH definem um conjunto de credibilidade quase como o nosso conjunto tangente. Interessante é que definem a credibilidade de uma futura observação: trabalham no espaço amostral e não no espaço paramétrico, o que também é valido se encararmos uma predição como uma avaliação de um novo parâmetro, a futura observação invisível. Isto é feito apenas no segundo parágrafo do início da seção 17.3.5. Daí por diante colegas, a mesma preocupação de marginalização e a construção de conjuntos de 95% de credibilidade é o foco do trabalho. Ressalto que ali também se trata de hipóteses pontuais.

Procurei outras referências não tão importantes como as acima citadas, mas todas pecam pelo mesmo mal, querem resolver problemas frequentistas usando técnicas Bayesianas. Creio que o defeito de parte do trabalho dos Bayesianos é olhar soluções clássicas e tentar repeti-las com o sabor Bayesiano. Em nosso trabalho somos Bayesianos e nos defendemos, em muitos artigos do Julio Stern, usando a lógica e a filosofia. Aos que gostam de discussões mais profundas, recomendo fortemente o trabalho dele na página WWW.ime.usp.br/~jstern. Sobre ser nosso método genuinamente Bayesiano, colegas liderados pelo Sergio publicaram o artigo ?On the Bayesianity of Pereira-Stern tests." TEST 10: 291-9 (2001).

Mas fiquem os colegas tranqüilos que meus amigos Sergio e Julio foram além das menções de outros colegas. Sergio descobriu o trabalho de Sanjib Basu (1996) ? A new look at Bayesian point null hypothesis testing, Snkhiã A 58(2):292-310 ?. Como o próprio título diz se restringe as hipóteses pontuais e não usa uma solução invariante. Convido os colegas para uma leitura cuidadosa para ver como ele também vê a necessidade de uma medida Bayesiana de significância: Basu procura também um conjunto tangente para definir sua significância, mas não conseguiu invariância. Julio encontrou em sua área de trabalho algo que quase chega aonde chegamos, só perdendo para invariância de nosso método. Parece que não acreditavam ser invariância indispensável para um bom método. Vejam Didier Dubois & Henri Prade (1982), on several representations of an uncertainty body of evidence, in: Fuzzy Information and Decision Process, MM Gupta & E Sanchez (Eds).

Com respeito aos trabalhos de O´Hagan e de Lindley posso dizer que pessoalmente conversei com eles. Os dois não gostam muito de Sharp Hypothesis e me disseram que jamais pensariam em ter uma medida de significância concorrente do p-value: mesma opinião de J Kadane. Mais do que isso, Dennis me escreveu uma longa carta, disponível na página do Julio, a qual me dá a certeza que estamos sim no bom caminho.

Nosso primeiro trabalho foi publicado em 1999 na ENTROPY e desde então temos publicado anualmente algo sobre o FBST. Em revistas de estatística, além de um publicado no inicio deste ano, temos dois artigos esperando para publicação e outro ainda sendo avaliado. Em revistas de lógica e filosofia, creio que o Julio tenha uns três no prelo e outros dois sendo avaliados. Notem os colegas que neste ano tivemos a publicação da enciclopédia internacional de estatística e nosso FBST é um capítulo desta obra. Depois do discurso acima quero convidar os colegas a olharem nosso FBST positivamente, pois ele pode trazer muita produtividade acadêmica e científica.

Vejam em http://www.mdpi.com/1099-4300/1/4/ nossa primeira publicação do FBST e uma longa revisão em http://ba.stat.cmu.edu/vol03is01.php. As boas e necessárias propriedades do FBST vêm sendo publicadas a cada ano em paralelo a diversos artigos de aplicações.

Gostaria de acrescentar que, como eu, meus colegas não poderiam imaginar que tão simples idéia não tivesse sido explorada antes de nós, fiquei esses anos procurando onde poderia ter sido o FBST usado. Não encontrei!

Carpe diem!


Carlos Alberto de Braganca Pereira <cpereira@ime.usp.br>

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