[Prévia] [Próxima] [Prévia por assunto] [Próxima por assunto]
[Índice cronológico] [Índice de assunto]

Descaso com o Nordeste



 Descaso com o Nordeste

(Gauss M. Cordeiro e Mariz Menezes)


Há décadas ouvimos falar em seca no Nordeste e em possíveis soluções,
mas nenhuma ação efetiva foi executada até hoje para resolver o
problema. O projeto de redenção dessa região, segundo alguns
especialistas, é a transposição das águas do Rio São Francisco.
Algumas pessoas são contra a execução desse projeto alegando que
retirar água do rio poderá provocar um déficit energético. Nada como
as estatísticas para explicar os fatos como eles realmente são. A
vazão média regularizada do Rio São Francisco é cerca de 2.250 m3/s.
Para se ter uma ideia de uma vazão dessa ordem, o abastecimento de
água de toda a região metropolitana de Recife efetua-se com, apenas,
16 m3/s. As projeções da transposição indicavam que seria retirada do
Velho Chico uma vazão média de 40 m3/s e máxima de 70 m3/s e, claro,
isso não é pouco.

A obra de transposição começou em 2007 e poderá beneficiar 13 milhões
de nordestinos castigados pela seca levando água através de mais de
600 km de canais de concreto para cerca de 400 municípios dos estados
de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Para o desvio das
águas do rio, será utilizada a captação de 1,5% da vazão nominal do
rio. Ressalte-se que o erro cometido no uso da série histórica para
estimar essa vazão média não supera 4%. Como resultado prático,
haveria água suficiente para aliviar o sofrimento, a fome e a miséria
dessa população. O Nordeste enfrenta a pior seca das últimas décadas,
afetando a economia dos agricultores e pecuaristas que estão perdendo
suas lavouras e cabeças de gado. Inicialmente, a obra custaria R$ 4,5
bilhões. Hoje, quase que duplicou o seu valor. Entretanto, representa
apenas 1/3 do total de R$ 28 bilhões a serem gastos com estádios e
infraestrutura para a Copa do Mundo. Apenas 43% das obras de
transposição foram concluídas, mas a competição será iniciada em junho
do próximo ano.

Se a maior parte da população ribeirinha for cultivar frutas às
margens do Rio São Francisco, a retirada de água poderá afetar a
capacidade de geração das usinas, comprometendo a situação energética.
Necessário torna-se, entretanto, verificar que, ao promover-se a
irrigação do sertão, as características regionais seriam alteradas e o
tão chamado Polígono das Secas poderia ser bastante reduzido ou
existir por menor tempo (chove, às vezes).

A água que cai do céu vem da Terra e contém, em sua composição, o
oxigênio que as plantas exalam. Ao avistarmos o mar, constatamos a
elevada taxa de evaporação que provoca o surgimento de nuvens que
darão origem à chuva. Se for levantada a pluviometria da região no
entorno do lago de Sobradinho, desde a sua formação, poderemos
constatar, quem sabe, que as condições ali melhoraram. O espelho de
água do lago é imenso e faz alusão, como nos cordéis, a que o sertão
virou mar. Hoje, não só os plantadores de frutas beneficiam-se da água
do velho Chico, mas muitos outros, inclusive vinícolas. O que entrava
o projeto é a falta de vontade e a incompetência dos responsáveis para
gerenciá-lo. Por favor, concluam o projeto e esqueceremos que os
infelizes camponeses perderam suas caquéticas vaquinhas recentemente.