Pr�mio Santista de Inform�tica

Cl�udio L. Lucchesi

30 de setembro de 1999


Em primeiro lugar gostaria de saudar o Exmo. Dr. Geraldo Alckmin Filho, Vice-Governador do Estado de S�o Paulo, e o Exmo. Prof. Dr. Miguel Reale, Presidente da Funda��o Santista, em nome de quem sa�do todas as autoridades presentes. Minhas Senhoras, meus Senhores.

Agrade�o a Funda��o Santista pelo pr�mio que me concedeu, e que para mim � um grande est�mulo, acima de tudo.

Quero registrar aqui um fato sobre os outros tr�s premiados, que, acho, n�o pode ser coincid�ncia: a jovem Leila trabalha na mesma �rea em que eu trabalho, Teoria da Computa��o; o Prof. Rege tamb�m � da UNICAMP; o jovem Cec�lio tamb�m fez seu doutorado na Universidade de Waterloo, no Canad� (o fato de ele ter feito o seu doutorado mais de uma d�cada depois n�o cai no exame...).

As minhas origens s�o muito simples, meus quatro av�s eram italianos imigrantes. Os meus av�s maternos vieram para o Brasil ainda crian�as, no s�culo passado. Aqui cresceram, se conheceram, namoraram e casaram. Meus av�s paternos vieram para o Brasil durante a Primeira Guerra Mundial, j� casados. Em ambos os casos, eram pessoas simples, mas que valorizavam muito a educa��o. Em particular, para minha av� materna, a educa��o era quase uma obsess�o.

De forma que fui criado nesse ambiente simples, mas de muita valoriza��o da educa��o. Meus pais come�aram a trabalhar ainda adolescentes, para colaborar nas finan�as dom�sticas. Meu pai somente conseguiu terminar seus estudos � noite, trabalhando durante todo o dia. E foi nesse ambiente de trabalho e de respeito pela educa��o que cresci.

Meus pais sempre procuraram prover tudo que era necess�rio para que eu pudesse estudar, muitas vezes �s custas de muito sacrif�cio. Entretanto, a possibilidade de estudar em escolas p�blicas foi fundamental para mim. Os quatro primeiros anos em escolas que se costumava chamar de Grupos Escolares, depois mais sete anos em Col�gio Estadual e finalmente mais cinco anos na Escola Polit�cnica da USP (Universidade de S�o Paulo). A p�s-gradua��o, feita no Canad�, foi paga pela FAPESP (Funda��o de Amparo � Pesquisa do Estado de S�o Paulo).

Assim, toda a minha educa��o foi viabilizada por recursos provenientes do Governo do Estado de S�o Paulo. Ademais, as escolas p�blicas que freqüentei foram de excepcional qualidade. Particularmente, os quatro anos de gin�sio e os tr�s anos de colegial foram feitos no Col�gio Estadual de S�o Paulo, um col�gio que fica no Parque Dom Pedro II e que era um col�gio considerado de elite. Esse col�gio tinha inclusive autonomia da Secretaria de Educa��o V�rias vezes assisti, adolescente, defesas de tese de docentes que se candidatavam a dar aula nesse col�gio. Havia no Estado de S�o Paulo quatro ou cinco col�gios como o meu. O meu era o mais antigo, foi o primeiro Col�gio do Estado, fundado ainda no s�culo passado, da� seu nome Col�gio Estadual de S�o Paulo. Al�m dele havia em S�o Paulo o Caetano de Campos na Pra�a da Rep�blica, o Presidente Roosevelt na Rua S�o Joaquim, o Culto � Ci�ncia em Campinas e o Col�gio Canad� em Santos.

Era muito dif�cil ser aluno desses col�gios, havia um exame, chamado exame de admiss�o, em que o aluno tinha que demonstrar conhecimentos em Portugu�s, Aritm�tica, Geografia e Hist�ria. Eram col�gios de elite, na melhor interpreta��o da palavra elite.

Infelizmente, nem mesmo autonomia esses col�gios t�m mais. Os governos p�s-64 acabaram com a qualidade desses col�gios. Eu gostaria de enfatizar aqui, atrav�s do meu testemunho, a necessidade que temos de ter n�o s� escolas p�blicas, mas escolas p�blicas de qualidade. Escolas p�blicas em que os professores de Portugu�s conhe�am realmente o vern�culo. Escolas p�blicas em que os professores de Matem�tica saibam demonstrar teoremas, e assim por diante. Did�tica � importante, a Inform�tica pode sem d�vida contribuir. Mas fundamental mesmo � a compet�ncia do professor. E isso somente se consegue com bons sal�rios.

Antes que pensem que estou defendendo melhores sal�rios para os professores universit�rios, o que, diga-se de passagem, estou, quero dizer que a �nfase que pretendo dar aqui � principalmente para o professor prim�rio, que tem sido achincalhado nas �ltimas d�cadas. � ele que tem o dever de ensinar Portugu�s, a nossa l�ngua materna. � ele que tem que ensinar aritm�tica, para que n�o sejamos enganados, como temos sido, pelos credi�rios com juros escorchantes. � ele que que tem que ensinar no��es b�sicas de higiene e de h�bitos saud�veis. � ele que tem que ensinar sobretudo os princ�pios da cidadania, do respeito �s leis, e conscientizar as crian�as dos direitos e obriga��es dos cidad�os.

A nossa cultura � em alguns aspectos muito perversa. Quando temos um problema procuramos defender os nossos interesses, acima de tudo. Isto tem acontecido nas �ltimas d�cadas, principalmente com a educa��o. Quem pode pagar, coloca seus filhos em escolas particulares. Os outros, ora os outros que se danem. Acontece que a qualidade da escola particular tamb�m deixa a desejar e tem piorado visivelmente.

N�o nos iludamos. Eu sou professor h� mais de trinta anos e tenho perfeita consci�ncia, como os meus colegas tamb�m t�m, da deteriora��o da qualidade do nosso ensino. Os alunos, a cada ano que passa, s�o menos preparados. S�o talvez mais inteligentes, a estatura m�dia deles tem aumentado, mas est�o muito despreparados. Depois de trinta anos, a diferen�a � chocante. Notem que estamos falando da UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas), uma das melhores universidades do pa�s, cujos alunos s�o em sua grande maioria de classes privilegiadas, como o s�o os alunos das melhores universidades do pa�s.

O que acontecer� em uma ou duas gera��es? A que ponto teremos que descer antes que cheguemos � conclus�o de que � preciso valorizar a educa��o, sobretudo atrav�s da escola p�blica? A que ponto teremos que descer antes de chegarmos � conclus�o de que educa��o � um excelente e priorit�rio investimento?

Tenho perfeita consci�ncia do alto volume de recursos necess�rios para que os professores tenham um bom sal�rio. Mas tenho consci�ncia tamb�m do desperd�cio que existe, seja por parte dos administradores p�blicos, seja por parte dos administradores escolares.

Gostaria de ressaltar aqui as recentes medidas adotadas pelo Governo do Estado para conseguir que todos as crian�as tenham oportunidade de freqüentar a escola p�blica. O que eu gostaria, como cidad�o, � de ter certeza que esse progresso � imune �s mudan�as de governantes no poder. Espero que os eleitores d�em valor para a educa��o, de forma que haja alguma garantia de que esse progresso ser� mantido e ampliado pelas pr�ximas administra��es.

Para terminar, gostaria de fazer alguns agradecimentos: ao Valdemar Setzer, meu primeiro professor de computa��o, ao Isu Fang, que junto com o Valdemar dirigiam o ent�o Centro de Computa��o da USP nos anos 60, onde aprendi computa��o. Aos meus colegas, professores e funcion�rios, aqui presentes. Aos meus queridos amigos Imre Simon, Tomasz Kowaltowski, Jorge Stolfi e Ricardo Dahab. Aos meus alunos de p�s-gradua��o. Ao meu perene conselheiro e querido amigo, Al�sio De Caroli. Aos meus familiares.

E sobretudo aos meu pais. A melhor heran�a que um filho pode receber dos pais � a educa��o. Eu me considero privilegiado por ter recebido essa heran�a. Muito obrigado a todos.