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Norberto Dachs (por Djalma Pessoa)




Caros Redistas,

O Prof. Djama Pessoa escreveu um artigo muito interessante
sobre o Norberto Dachs que será publicado no próximo Boletim
da ABE.

Se alguém na rede não conhece o Djalma, ele foi um dos primeiros
brasileiros a se doutorar no exterior, o Primeiro Presidente
da ABE e um dos criadores da nossa associação.

Ele me autorizou a circular na rede da ABE o seu texto abaixo,
haja visto que muitos redistas não sendo sócios em dia da ABE
não receberão o Boletim. Aproveito a oportunidade, para
sugerir a esses redistas que agora, então, se associem a ABE.

Saudações,

Gauss



              Norberto Dachs (por Djalma Pessoa)


Foi motivo de grande pesar para mim a notícia do falecimento do Norberto. Tinha grande admiração e amizade por ele. Conhecemos-nos no fim da década de 1960, como alunos do programa de doutorado em Estatística de Berkeley, onde estava quando ele chegou. Apesar de sermos oriundos do ITA, onde eu trabalhara no Departamento de Matemática, não o conhecera por lá. Logo estabelecemos uma grande amizade, alimentada pelo convívio diário: morávamos na mesma vila da universidade e tínhamos escritórios no mesmo velho prédio de madeira.

Na locomoção para universidade fazíamos revezamento de automóvel, parando sempre no mesmo lugar para nos abastecer de doghnuts para o lanche. As conversas sobre os mais diversos assuntos eram intermináveis, e as nossas preferências eram distintas em relação ao Depto. Ele foi TA do Hodges numa disciplina introdutória de Não-Paramétrica e tinha grande entusiasmo pelo assunto. Defendia que uma boa forma de introduzir as idéias estatísticas, sem muito uso de Teoria de Probabilidades, era através de testes de permutação.
Na sua tese de doutorado, começou trabalhando com o Lehmann, de quem foi
grande amigo. Depois, passou a trabalhar sob a orientação do Bickel, que
havia sido meu orientador.

Quando retornei ao Brasil, ele ainda permaneceu em Berkeley, e eu deixei vários pepinos para ele resolver. Cordialidade e generosidade sempre foram características suas. Por ocasião de seu retorno ao ITA, eu já estava me transferindo para o IMPA. Na mudança, meus filhos deixaram para a Daniela, filha do Norberto, o cachorrinho deles, Calunga. Infelizmente, não tive a satisfação de ser seu colega de trabalho. Antes de ele sair do ITA, conseguiu encaminhar vários alunos para o programa de Mestrado em Estatística no IMPA, que estava se instalando. Todos tiveram excelente desempenho e foram importantes para a consolidação do programa.

Norberto teve participação ativa no fortalecimento da Estatística no
Brasil. As discussões sobre a criação da ABE começaram durante os Colóquios Brasileiros de Matemática de Poços de Caldas. Lembro-me de sua preocupação de não se criar mais uma instituição elitista, exclusiva de membros da comunidade acadêmica. Defendia que a ABE também atraísse a comunidade profissional de Estatística, o que está ainda por acontecer. Quando estava no ITA, ele apresentou no 1º SINAPE, em 1974, o trabalho: "Um sistema iterativo de análise exploratória de dados utilizando computador digital com unidade exibidora".

A Análise Exploratória de Dados era um tema de grande interesse para ele e posteriormente, já na Unicamp, escreveu uma apostila sobre o tema, popular entre os alunos e um marco sobre o assunto no Brasil.

Quando saiu do ITA, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde teve uma passagem curta pelo IBGE. Foi uma experiência interessante, que merece ser relatada. O presidente do IBGE na época era o Prof. Isaac Kerstenetsky, que conseguiu o apoio do ministro Reis Veloso para criar um grupo de elite em computação. Foi então criado no IBGE o Instituto Brasileiro de Informática (IBI) sob a liderança de Luis Carlos Gomes e Antonio Olinto. Além do Norberto, vários doutores participaram dessa experiência, entre eles, Marco Antonio Raupp, Sérgio Bragança, Renato Flores, João Lauro e Lélio Facó, Nelson do Vale. O Norberto esteve envolvido na criação de um sistema chamado SADE, Sistema de Análise de Dados Estatísticos. Seu entusiasmo pelo projeto era grande. Sem dúvida, tinha as qualificações desejáveis para prestar uma grande contribuição: ao lado da formação estatística juntava sua grande experiência na área de computação. Infelizmente, quando o projeto já estava em estágio adiantado, por razões políticas, foi decidida a compra de um pacote estatístico já pronto. Fui testemunha do entusiasmo inicial do Norberto e de sua grande decepção quando o projeto foi encerrado.

Depois de sua saída do IBGE, foi trabalhar no Departamento de Estatística da Unicamp, onde teve papel fundamental na criação do programa de pós-graduação em Estatística. Sempre foi um excelente professor, além de orientar grande número de dissertações de mestrado. De vez em quando, me convidava para participar da banca de dissertação de algum orientado, e nessas ocasiões tínhamos a oportunidade de colocar em dia os assuntos de família.

Perdemos o contacto depois que ele saiu da Unicamp e foi trabalhar na Organização Panamericana de Saúde, em Washington. A última vez que nos encontramos foi no Simpósio sobre o Ensino de Estatística e Estatística no Ensino, realizado no IMPA em julho de 2003. Ele estava retornando para a Unicamp, depois de longo período no exterior, entusiasmado com a perspectiva de se engajar em um projeto de aplicação da Estatística na área de Educação. Seu falecimento foi não só uma grande perda para a Estatística no Brasil como um motivo de grande tristeza para mim.