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Não resisti em trazer conflito



Caros redistas, colegas e amigos:

Achei que deveria entrar na discussão, pois minha vida acadêmica está muito ligada às aplicações e o uso da estatística, embora eu tenha desenvolvido algumas ferramentas para atender certas demandas que nos obrigam a ser criativos.

Nunca reclamei de minha classificação como pesquisador por achar, em parte, que o Klaus tem razão sobre como avaliar os trabalhos de aplicação. Não podemos desmerecer, entretanto, o nosso pessoal que colabora para a CIÊNCIA, participando de grupos de pesquisa de excelência ou das instituições publicas, IBGE, Ministérios da Educação, Ministério da Justiça entre outras. São sim trabalhos pioneiros e que exigem muita criatividade por parte dos estatísticos.

Em um dos papers que participei e dos mais comentados, meu trabalho foi eliminar toda a estatística apresentada e construir um gráfico simples que com uma pequena conta dava para resolver todos os problemas dos pesquisadores. O elogio do editor foi sensacional e, acho eu, só a minha experiência como velho estatístico permitiu isso. Se ninguém der valor a este trabalho (mesmo com um índice de impacto alto), não fiquem surpresos, pois eu mesmo darei o meu auto-valor.

Mas vou criar uma polêmica a partir daqui. Muitas vezes criamos ou desenvolvemos algo inovador e depois construímos a nossa própria indústria de papers técnicos e que, sem dúvida nenhuma são relevantes, mas nada de ciência e sim de tecnologia. Vou dar como exemplo o trabalho excepcional de nossos estatísticos brasileiros. Pegar uma distribuição conhecida de todos e colocar mais um parâmetro, por exemplo, nos permite sim criar uma indústria de papers. Mas o essencial já foi publicado no primeiro artigo que indicava como se poderia melhorar um modelo. O restante é questão de descobrir onde deveríamos colocar o parâmetro ou a transformação para tornar a nova distribuição mais geral.

Qual a revista que publica tais tipos de artigos? Aquelas que se dedicam a publicar tecnologia e que certamente não seria o TAS. Notem que não estou desmerecendo o trabalho de ninguém, pois isto Tb acontece com meu grupo de pesquisas.

Temos aqui uma indústria de papers do FBST, temos uma indústria de papers em processos de Dirichlet em riscos competitivos ou paralelos. Mas temos certeza que o essencial do FBST foi publicado lá atrás e depois com um paper longo no Bayesian Analysis. Tivemos a sorte, entretanto, de ter um filósofo em nosso grupo que introduziu nosso método no mundo da lógica e vem tendo uma produção incrível nesta linha de pesquisa.

Sobre o processo de Dirichlet multivariado publicamos o essencial nas revistas Nonparametrics e Multivariate Analysis. Mas isso faz alguns anos e o trabalho que um colega do grupo vem desenvolvendo é para corrigir as besteiras que andávamos fazendo com as tecnicalidades por sermos um pouco desleixados nestes assuntos. Este colega foi além e colocou nosso processo no mundo dos sistemas paralelos e coerentes.

Quando falamos do TAS devemos notar que somente inovações e formas especiais de motivação são ali publicadas. Assim como o Statistical Science, não vamos ver muitas tecnicalidades nessas publicações.

Quero ainda chamar a atenção para o fato de alguém na rede ter dito que só publicou em uma revista porque tinha um Qualis alto e se soubesse da reclassificação mais baixa não teria enviado para aquela revista seu artigo. Acho que esta afirmação foi demais para mim. Nossos papers deveriam ser consequência de nossos trabalhos e não o objetivo deles. Ter como objetivo a publicação em uma revista específica é não olhar cientificamente nosso próprio trabalho.

Alguns de nossos colegas vêm publicando nos annals e posso dizer que gostaria muito de um dia ter um trabalho meu aceito nesse tipo de publicação. Ainda não cheguei lá e não sei se um dia terei essa honra. Mas como disse não vou colocar isso como objetivo. Vou colocar como objetivo sim resolver adequadamente o trabalho de meus colegas cientistas da medicina do Butantan ou mesmo da sociedade de Jurimetria. Tenho certeza que se conseguir além de apresentar solução adequada também esta for inovadora a publicação será mesmo consequência de meu trabalho.

Por último gostaria de dar os parabéns ao Enrico que faz um trabalho de aplicações magnífico. Gostaria que tivesse a certeza que muitos de nós apreciamos os trabalhos dele e, além disso, os usamos no nosso dia a dia, tanto em sala de aula como em nossas orientações. É isso que conta na nossa vida acadêmica multidisciplinar, o novo jargão da ciência.

Carlos Alberto de Braganca Pereira <cpereira@ime.usp.br>