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Re: Why the future doesn't need us.
- Subject: Re: Why the future doesn't need us.
- From: Tiago <tminc@uol.com.br>
- Date: Mon, 03 Sep 2001 17:19:11 -0300
Também tenho uma coisa ou outra a concordar e mais algumas a discordar de Bill
Joy:
Em primeiro lugar, aproveitando o comentário do Michel, sinto-me obrigado a
dizer que imortalidade, pra mim, é outra coisa. colocar todos os meus
pensamentos, experiências, sonhos, memórias, etc. em um HD não vai me tornar
imortal. Poderia, do meu leito de morte, observar o andróide, a me olhar
tristemente, e nesse momento nossos pensamentos seriam diferentes: o dele seria
cheio de pena, por mim, e um pouco de alívio por se sentir livre do corpo,
finalmente. ele me olharia um tanto como a menininha do Cidade dos Anjos, ao
observar seu corpo sem vida. Meu eu real, por outro lado, não sentiria o mesmo
conforto, pois eu estaria, efetivamente, morrendo, e o fato de ter-me copiado
para um robô não me traria nenhuma satisfação.
Esse tipo de imortalidade, que só existe aos olhos de quem está fora e poderá
conversar comigo depois que eu morrer, não me interessa em absoluto. Mesmo que
eu fosse copiado para outro corpo, quem sabe muitos anos mais jovem. Imaginem um
médico renomado e experiente, que nunca deixaria este mundo, e que poderia ser
copiado para lá e para cá, e poderia inclusive acumular conhecimento de outros
médicos. Uma hora, todos os médicos serão iguais. Uma hora, para fazer faculdade
de medicina, o aluno faz um download dos conhecimentos necessários e levanta-se
da cadeira, algum tempo depois, com 235 anos de experiência clínica.
Mais do que isso, imaginem os efeitos colaterais: um cara pode ser um excelente
piloto de avião e um péssimo marido. Ou pode ser alcoólatra. Se a consciência
pode ser copiada, sem erros, também pode ser editada, e quem detivesse o
controle da cópia (uma elite), acabaria por ditar as regras: removendo os
defeitos, comportamentos indesejados. Bom, aos olhos da elite, um comportamento
ativista pode ser indesejado e removido, com ou sem a autorização do original.
chegaríamos a Gatacca pelo outro lado. Será que existiram leis de copyright para
consciências? Será que elas funcionariam? Duvido.
Outra coisa que gostaria de comentar, por enquanto (afinal, é muita coisa pra
digerir!), é a absurda idéia que ele tem sobre o conhecimento de alto risco.
Concordo que armas de destruição de massas baseadas em conhecimento são o maior
risco do século, e dos próximos. Mas negar a busca desse conhecimento é
impraticável. Se esse conhecimento perigoso não é buscado abertamente, vai ser
buscado secretamente, e talvez por mãos erradas. Não enxergar um problema não o
faz desaparecer. "Relinquishment", como ele coloca, é certamente mais perigoso
que o conhecimento em si. Ainda mais por que ninguém é capaz de julgar o
desconhecido, e "os grandes problemas encerram a própria solução".
Pergunto a todos: se Hiroshima e Nagasaki não tivessem acontecido, será que o
mundo teria se mobilizado na direção do desarmamento? Até hoje, não há
mobilização semelhante quanto a nenhuma outra categoria de armamentos, incluindo
as armas biológicas. Quero chamar atenção também para as bombas de pulso
magnético, cujo efeito pode ser muito catastrófico, mas como nunca foram usadas
amplamente, quase não são discutidas.
É muito claro pra mim que negar a busca de um conhecimento não é uma opção
viável. Tampouco seria o controle. A proposta de controle que Bill Joy sugere
seria cômica se não fosse assutadora. Para mim, não existe justificativa para a
perda, mesmo parcial, da privacidade. Ainda mais no ciberespaço. Acho que as
pessoas se esquecem de que a informação protegida tem muito mais valor que a
pública. Se o funcionamento de uma arma química é conhecido de todos, é muito
menos provável que alguém a use. Parece ridículo dizer isso, mas não é. Não vou
me aprofundar para o e-mail não ficar muito mais longo do que já está.
Acho muito mais viável a disseminação da utopia de Jacques Attali, a
Fraternidade. Esse é o valor mais desprezado na nossa sociedade atual. Se o
cientista é imune a processos de empresas quando publica sua pesquisa, mas ele é
pessoalmente responsável pelas consequências do mal uso de sua descoberta, ele
será sempre guiado pela ética. Ética e fraternidade são as palavras-chave. Como
disse o próprio Attali, "a Eternidade, a Igualdade e a Liberdade são direitos, a
Fraternidade é uma obrigação moral."
Desculpem a msg imensa, depois escrevo mais.
Tudo de bom!
Tiago "protegido contra cópias" Silveira.