[CURSO DE TEORIA DOS GRAFOS]
[Dicionário]
Os números de capítulos,
seções, teoremas e exercícios se referem ao
livro de Diestel, 2a edição.
Para os pré-requisitos de probabilidade discreta,
sugiro consultar
Cormen, Leiserson e Rivest,
Introduction to Algorithms
(MIT Press & McGraw-Hill, 1992),
cap. 6.
11. Grafos aleatórios
Probabilidade discreta
-
Digamos que nosso espaço amostral é um conjunto finito U.
Um evento é um subconjunto de U.
Um evento elementar é um elemento de U.
-
Uma distribuição de probabilidades discreta
é uma função P que associa a cada evento elementar u
um número no intervalo [0,1] e satisfaz
∑u P(u)
=
1,
onde ∑u denota o somatório sobre
todos os u em U.
-
Dada uma distribuição de probabilidades P,
a probabilidade de um evento A
é o número P(A)
:=
∑a P(a),
onde a soma ∑a
se estende a todos os a em A.
Consequências simples:
para quaisquer A e B,
- se A ⊆ B
então P(A) ≤ P(B);
- P(A ∪ B)
= P(A) + P(B)
− P(A ∩ B).
-
Dois eventos A e B são independentes
se P(A ∩ B)
=
P(A) · P(B).
-
Uma variável aleatória é uma função, digamos X,
de U em R+
(ou seja, todos os números reais não negativos).
O valor esperado de uma variável aleatória X é
E(X)
:=
∑u P(u) X(u),
com a soma se estendendo a todos os
elementos u de U.
-
Lema 11.1.4 (Desigualde de Markov):
Se X é uma variável aleatória não negativa
e a um número estritamente positivo então
P [X ≥ a]
≤
E(X) / a.
-
Corolário 11.4.1 (Desigualde de Chebyshev):
Para qualquer variável aleatória X
e qualquer lambda > 0, temos
P [|X − mü| ≥ lambda]
≤ sigma2 / lambda2,
onde mü := E(X) e sigma2
:=
E((X − mü)2)
= E(X2) − mü2.
11.1 O conceito de grafo aleatório (= random graph)
-
Espaço amostral G(n) :
todos os grafos sobre o conjunto de vértices V =
{0, … , n−1}.
Cada elemento de G(n) pode ser entendido
como um vetor de 0s e 1s indexado
pelo conjunto [V]2 de todos
os pares não ordenados de elementos de V.
É claro que G(n) tem 2N grafos,
onde N
:=
(n2).
-
Para qualquer p no intervalo [0,1],
seja P a distribuição de probabilidades definida assim:
para cada grafo G, P(G)
=
p‖G‖qN−‖G‖,
onde q := 1 − p e
N
:=
(n2).
Observe que a soma das probabilidades sobre todos os grafos
vale 1:
∑G P(G)
= ∑ p‖G‖qN−‖G‖
= ∑ (Nm)
pmqN−m
= (p+q)N
=
1.
Exemplo: Quando p = ½,
temos P(G) = 2–N, ou seja,
todos os 2N grafos têm
a mesma probabilidade.
-
O espaço amostral
G(n) com essa distribuição P de probabilidades
é denotado por G(n, p).
-
Para cada e em [V]2,
seja Ae
o evento formado por todos os grafos em G(n, p)
em que e é uma aresta.
Proposição: P(Ae) = p.
Prova:
P(Ae) =
∑G p‖G‖qN–‖G‖.
Como Ae tem exatamente (N−1m−1)
grafos com m arestas, temos P(Ae)
= ∑m (N−1m−1) pmqN−m
= p ∑k (N−1k) pkqN−1−k
= p (p+q)N−1
= p,
onde a primeira soma tem m variando de 1 a N e
a segunda tem k variando de 0 a N − 1.
-
Analogamente, se
Be
é o evento formado por todos os grafos em G(n, p)
que não têm a aresta e então
P(Be) = q.
-
Suponha que e e f são elementos distintos
de [V]2.
Um cálculo análogo ao que fizemos acima mostra que
P(Ae ∩ Af)
= p2
= P(Ae) P(Af).
Portanto,
os eventos Ae
e Af são independentes.
Analogamente,
Ae e Bf
são independentes,
Be e Bf
são independentes,
Be e Af
são independentes.
-
Lema 11.1.2:
Para n ≥ k ≥ 2,
a probabilidade de que um grafo G em
G(n, p)
tenha k vértices dois a dois independentes é P [alpha(G) ≥ k]
≤
(nk) qK,
onde K := (k2).
-
Teorema 11.1.3 (Erdös):
Para todo k ≥ 3,
existe um grafo G com |G| ≤ 2k/2
tal que
omega(G) < k
e
alpha(G) < k.
(Em outras palavras,
o número de Ramsey R(k) é maior que 2k/2.)
Aqui, omega(G) é o maior r
tal que Kr é subgrafo de G.
Prova:
Se n ≤ 2k/2 e
G está em G(n, ½)
então P [omega(G)≥k e
alpha(G)≥k]
≤ P [omega(G) ≥ k]
+ P [alpha(G) ≥ k]
< ½ + ½
=
1.
- Exercícios:
-
[11.1, modificado]
Qual a probabilidade de que um grafo aleatório
em G(n, p)
tenha menos que m arestas?
-
[11.2]
Qual o número esperado de arestas de um grafo
em G(n, p)?
-
[11.3]
Qual o número esperado de subgrafos Kr
em um grafo G de
G(n, p)?
11.2 O método probabilístico
11.3 Propriedades de quase todos os grafos
-
Uma propriedade gráfica
é um subconjunto de
G(n, p)
fechado sob isomorfismo
(ou seja, para quaisquer dois grafos isomorfos em
G(n, p),
ambos estão no subconjunto ou nenhum dos dois está no subconjunto).
-
Para qualquer propriedade gráfica P,
se a probabilidade P [G ∈ P]
tende a 1 quando n tende a infinito,
dizemos que quase todos os grafos em
G(n, p)
pertencem a P.
Analogamente,
se a probabilidade P [G ∈ P]
tende a 0 quando n tende a infinito,
dizemos que quase nenhum grafo em
G(n, p)
pertence a P.
-
Lema 11.3.2:
Um grafo G tem a propriedade
Pi,j
se, para quaisquer conjuntos mutuamente disjuntos U e W
com não mais que i e j vértices respectivamente,
existe um vértice v fora de U ∪ W
que é adjacente a todos os elementos de U e a nenhum
dos elementos de W.
Para qualquer número p no intervalo (0,1)
e quaisquer números naturais i e j,
quase todo grafo em G(n, p)
tem a propriedade Pi,j.
-
Corolário 11.3.3:
Para qualquer número p no intervalo (0,1)
e qualquer número natural k,
quase todo grafo em G(n, p) é k-conexo.
-
Corolário 11.3.1:
Para qualquer número p no intervalo (0,1)
e qualquer grafo H com n ou menos vértices,
quase todo grafo em G(n, p)
tem um subgrafo induzido isomorfo a H.
-
Proposição 11.3.4:
Para qualquer número p no intervalo (0,1)
e qualquer ε > 0,
quase todo grafo G em G(n, p)
tem chi(G)
>
c(ε) n / log n,
sendo c(ε)
= −log (1−p) / (2 + ε).
- Exercícios:
-
[11.6]
Suponha que P1 e P2
são propriedades gráficas.
Prove a seguinte afirmação:
se quase todos os grafos em G(n, p)
têm P1
e quase todos têm P2
então também quase todos têm ambas as propriedades.
-
[11.7, fácil]
Seja p um número no intervalo (0,1).
Mostre que quase todo grafo em G(n, p)
tem diâmetro 2.
-
[11.8]
Seja p um número no intervalo (0,1).
Mostre que quase nenhum grafo em G(n, p)
tem um subgrafo completo separador.
-
[11.9]
Deduza o Corolário 11.3.1 do Lema 11.3.2.
-
[11.12]
Seja H um grafo qualquer com n ou menos vértices.
Mostre que existe uma função p(n) que tende
a 0 quando n tende a infinito mas quase todo grafo
em G(n, p(n))
tem um subgrafo induzido isomorfo a H.
11.4 Limiares de propriedades
-
A seção anterior sugere que o espaço
G(n, p)
com p constante (ou seja, independente de n)
não é muito interessante.
É mais interessante estudar o espaço
G(n, p)
em que p é uma função de n
(com p(n) ≥ 0 para todo n).
Especialmente interessante é o caso em que p(n) tende a zero quando n
tende a infinito.
-
Idéia informal do conceito de limiar:
Suponha que P é uma propriedade gráfica
e t uma função de n
(por exemplo,
t(n) = 1 / n).
Dizemos que t(n) é limiar para P se
quase nenhum grafo em G(n, p(n))
está em P quando p(n)
cresce mais devagar
que t(n) e
quase todos os grafos em G(n, p(n))
estão em P quando p é cresce mais rápido
que t(n).
-
Um limiar (= threshold function)
para uma propriedade gráfica P
é uma função t(n) tal que t(n) ≠ 0 para todo n e,
para toda função p(n),
-
se lim p(n) / t(n) = 0
quando n tende a infinito
então quase nenhum grafo de G(n, p(n))
pertence a P e
-
se lim p(n) / t(n) = ∞
quando n tende a infinito
então quase todo grafo de G(n, p(n))
pertence a P.
-
Teorema 11.4.3 (Erdös & Rényi):
Para qualquer grafo equilibrado H com uma ou mais arestas,
a função n −|H| / ‖H‖
é um limiar para
a existência de um subgrafo induzido isomorfo a H.
Aqui, um grafo H é equilibrado se d(H') ≤ d(H)
para todo subgrafo H' de H.
Resumo da primeira parte da prova:
Seja t(n)
=
n|H| / ‖H‖
e X(G) o número de subgrafos de G
isomorfos a H.
Então P [X ≥ 1]
≤
E(X)
≤ p(n)‖H‖ / n|H|
= (p(n)/t(n))‖H‖.
Se esse quociente tende a 0 então a probabilidade tende a 0.
Resumo da segunda parte da prova:
Seja mü := E(X) e sigma2 :=
E((X−mü)2).
Então P [X = 0]
≤ P [|X−mü| ≥ mü]
≤ sigma2/mü2
= E(X2)/mü2 − 1
≤ c n p(n)−‖H‖/|H|
= c (p(n)/t(n))−‖H‖/|H|,
onde c não depende de n.
Se p/t tende a infinito,
essa última expressão tende a 0.
-
Corolário 11.4.4:
A função n−1 é um limiar
para a existência de um subgrafo isomorfo a um ciclo
-
Corolário 11.4.5:
Para qualquer árvore T com k ≥ 2 vértices,
a função n−k / (k – 1)
é um limiar para a existência de um subgrafo isomorfo
a T.
-
Corolário 11.4.6:
Para todo k ≥ 2,
a função n−2 / (k – 1)
é limiar para a existência de um subgrafo isomorfo
a Kk.
- Exercícios:
-
[11.15]
Uma propriedade gráfica é crescente
se for fechada sob acrescimo de arestas (ou seja,
se G tem a propriedade e xy é um par de vértices não
adjacentes então G+xy também tem a propriedade).
Encontre um propriedade gráfica crescente que não tenha limiar.
Encontre uma propriedade gráfica não crescente que tenha limiar.
-
Suponha que H é um Kn−1 + v
(ou seja, um grafo completo com n−1 vértices
mais um vértice isolado.
Qual a probabilidade de que um grafo em G(n, p)
seja isomorfo a H?
-
[11.16, fácil]
Seja H um grafo e
h o número de grafos isomorfos a H
sobre o conjunto de vértices {1, … , k},
onde k := |H|.
Mostre que h ≤ k!.
Para que grafos H vale a igualdade?
-
[11.17, fácil]
Para todo k ≥ 1, determine o limiar da propriedade
{G : Delta(G) ≥ k}.
-
[11.18, fácil]
Seja d um número natural
e seja P a propriedade dos grafos
que incluem um cubo d-dimensional.
A propriedade P tem limiar? Qual?
-
[11.20]
Seja P
a propriedade dos grafos que contêm uma árvore com k
vértices
(k ≥ 2 fixo).
A propriedade P tem um limiar?
Qual?
-
Dê os detalhes da demonstração das equações (3) e (7),
na prova do Teorema 11.4.3.
(A equação (3) afirma que
E(X) = ∑ P[H' ⊆ G],
com soma sobre todos os H' em H.
A equação (7) afirma que E(X2)
=
∑ P [H' ∪ H'' ⊆ G],
com soma sobre todos os pares (H', H'')
em H2.
Em ambos os casos,
X(G) é o número de subgrafos de G
isomorfos a H.)