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Re: [ABE-L]: Século XXI



Caros,

Acho extremamente interessante a ligação entre Estatistica e Filosofia da Ciencia levantada já por vários membros desta lista. O período histórico de proposição dos procedimentos clássicos me parece relevante, visto que o final do século 19 e início do 20 é marcado pelo ápice do chamado positivismo lógico que é marcado pela rejeição da possibilidade de indução e, por consequencia, do enfoque bayesiano.

No entanto, acho arriscado seguir a trilha de Feyerabend cujas conclusões vão muito mais longe do que a aceitação de metodologias complementares com pesos semelhantes. O mesmo Feyerabend afirma:

"Equal weight should be given to competing avenues of knowledge such as astrology, acupuncture and withcraft"

Ou seja, isso é a negação da possibilidade de utilizar evidências para decidir no que acreditar. Feyerabend é o inimigo número um da estatística, para ele, o que sabemos é apenas mais um fenômeno sociológico (e somente sociológico). Isso é deletério para todos nós físicos e estatísticos (ou fisico-estatisticos).


Saudações
Renato


Citando Luis Paulo Vieira Braga <lpbraga@im.ufrj.br>:

A proliferação de teorias é benéfica para a ciência, ao passo que a
uniformidade prejudica seu poder crítico. A uniformidade também ameaça o
livre desenvolvimento do indivíduo.
Contra o método, P.Feyerabend,Ed. UNESP, 2007.

A ciência não é nem uma tradição isolada nem a melhor tradição que há,
exceto para aqueles que se acostumaram com sua presença, seus benefícios e
suas desvantagens. Em uma democracia, deveria ser separada do Estado,
exatamente como as igrejas ora estão dele separadas.
Idem.


Os métodos  estatísticos constituem uma dentre as muitas alternativas
científicas para lidar com a incerteza. Métodos matemáticos, como Lógica
Fuzzy, ou computacionais, como Redes Neurais têm sido utilizados com mais ou
menos êxito dependendo da classe de problemas.

Como se sabe o paradigma bayesiano precedeu historicamente o paradigma
frequencista, Fisher não se opunha ao método de Bayes mas ao seu uso
inadequado ? prioris baseadas em opiniões e não em evidências científicas ?
neste caso preferia a alternativa  do teste de significância para rejeitar
uma hipótese que estivesse em desacordo com os fatos observados. Neyman e
Pearson desenvolveram a metodologia do testes de hipóteses a partir das
idéias de Fisher. No entanto a utilização inadequada desta metodologia
alimentou as controvérsias entre as duas escolas. A mais antiga sendo
questionada pela uso de prioris subjetivas, e a mais nova pela dissimulação
de opções subjetivas, como , por exemplo, a suposição de infinitos ensaios
para um experimento. Um detalhado, porém, acessível relato deste debate pode
ser encontrado no capítulo 7, do livro Scientific Method, de H.G. Gauch,
Cambridge Univ. Press, 2003.

Parte da controvérsia pode ser explicada por um desentendimento dos
objetivos de cada método. Para os bayesianos a questão é determinar a
probabilidade de que uma hipótese seja verdadeira dadas observações e um
conhecimento a priori além do experimento conduzido. Já para os
frequencistas a questão é quão confiável  é o resultado de uma inferência
em virtude da rejeição ou aceitação de uma hipótese nula ou alternativa,
respectivamente. A formulação de Neyman e Pearson estava em consonância com
o principio da falseabilidade de Popper, formulado na mesma época, embora
não se tenha registo de que tenha havido contacto entre eles. Segundo este
principio o conhecimento científico pode ser testado pela negação ao invés
da comprovação. Se resiste às tentativas de negação, então isto é um indício
favorável à sua veracidade.

Ao contrário das opiniões restritivas aos debates recentes nesta lista, cito
mais uma vez Feyerabend que vai além da teoria da falseabilidade de Popper ?
Para lutar contra o dogmatismo, é imperativo promover teorias inaceitáveis
para muitos, multiplicadas elas terão a função de descobrir fatos que
autorizem a aceitabilidade das teorias originais.

Este é o verdadeiro espírito da ciência no século XXI e não o negócio
público ou privado em que foi transformado.