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C ou K?



Caros Redistas,

Para descontrair um pouco da polÃmica bem construtiva
C ou K, uma divertida canÃÃo muito antiga de Luiz Gonzaga
jà anelava essa diferenÃa. Vejam abaixo a letra.

Quem nÃo gostar do GonzagÃo (serà que existe alguÃm?)
peÃo desculpas pela ousadia, mas a letra à muito
interessante.

SaudaÃÃes,
Gauss



Karolina com K


Karolina foi o maior estrupÃcio que eu encontrei na minha vida.

Ah, mulher bagunceira da mulesta... Mulher cangaceira... Conheci Karolina num forrà que
eu tava tocando. Quando avistei aquela mulherzona diferente no meio do salÃo, sem danÃar
com ninguÃm, sà mangando dos matutos, eu pensei comigo: "Aquilo deve ser um pedaÃo
de mau caminho... Mulher bonita, morena trigueira... Cabelo comprido, boa linha de lombo..."

Aà eu comecei a caprichar no fole vÃio pra ver se ela dava fà de mim.
Mas ela nem fà deu. E eu pensei comigo: "Deixe estar, danada. Se aparecer aqui um
colega pra me dar uma ajuda eu vou aà pra tu ver o que à bom pra tosse."

AÃ apareceu o Anselmo.

"Ã Anselmo, pega essa sanfona aqui."

Anselmo pegou a sanfoninha, fui na banca de SÃ Marica.
"Sà Marica tem cerveja? Bote um cÃlice. Cervejinha à essa,
SÃ Marica? SÃ tem espuma!"

"Oxente? Cerveja quente à assim mesmo!"

"Apois. Bote duas encangadas aà no fundo do pote, que eu volto mais tarde."

AÃ me botei pro salÃo com mais de mil. Cheguei perto dela e disse:

"Que mal pergunte, à vosmecà que à a Karolina?"

Ela escorou na perna esquerda, descansou a direita, botou a mÃo
nos quartos, balanÃou e disse:

"Pergunta à bem. Karolina com K".

Ha.

"Quer danÃar mais eu?"

"SÃ se for agora."

Abufelei. E saà com essa mulher.

Joguei ela pra direita, ela veio; joguei ela pra esquerda, ela tava aà --
a mulher era adivinhona... Chamei a mulher no vÃo do carcarà -- sabe como
à o carcarÃ, nÃ? Ele voa na vertical, pÃra no ar e fica peneirando... Aà eu
vim descendo com ela bem devargazinho nos meus braÃos. Quando ela triscou
os pÃs no chÃo, deu uma gaitada:

"Hahai, Ã hoje!"

"Ã hoje mesmo!"

AÃ saÃmos fazendo aqueles fuxicos todos. A mulher pegou o cabelÃo, enrolou
na mÃo -- assim como vaqueiro quando vai derrubar boi --, pendeu a cabeÃa
por um lado e saiu rodando...
E eu rodando mais ela, e dando cheiro no cangote dela. A essa altura nÃs jÃ
tava fazendo era teatro. Era o maior burburinho do mundo. AÃ eu disse pra ela:

"Karolina, vamo acolÃ?"

Ela respondeu:

"Bora..."

Chegamos na banca de SÃ Marica. "SÃ Marica, cervejinha!" Ela botou uma,
nÃs be bemos. "Bote mais uma!" Ela botou a outra, nÃs bebemos. "SÃ Marica, bote mais duas
encangadas aà no fundo que nÃs vamos voltar mais tarde."

Voltamos pro salÃo. NÃs nÃo tava fazendo aquelas misÃrias todas mais nÃo.
Aà nÃs jà tava sereno. NÃs jà tava daquele jeito... Maior felicidade.

AÃ ZÃ de Bahia chegou, bateu a mÃo no meu ombro e disse:

"Gonzaga, acabou a festa."

"Oxente? Acabou a festa?"

"Acabou pra vocÃ. Vocà agora vai tocar.
Vocà que à o tocador? Vocà tà aqui fazendo arte, tà fazendo atà teatro, và tocar."

"Pois tà certo!"

Cheguei perto do Anselmo e disse:

"Anselmo, passa a sanfona pra cà e vai danÃar com Karolina.
Mas nÃo vÃo pra longe nÃo, hein? Fiquem danÃando aqui em volta de mim."

Anselmo achou foi bom. AÃ eu caprichei.

De vez em quando Anselmo passava por perto de mim, Karolina dava
uma rabana da de vestido pra riba d'eu, cobria a sanfona...
E eu sentia sà aquele cheirinho de flor de amor... Maior felicidade.

AÃ ZÃ de Bahia gritou de lÃ: "Ã cinco mil-rÃis! TÃ na hora da cota! Ã cinco mil-rÃis!
Quem nÃo pagar nÃo danÃa! Ã cinco mil-r -- nÃÃÃÃo... TÃ conversando, hÃme? Oxente?
NÃo quero cocorà nem choro baixo. à cinco mil-rÃis! Cinco mil-rÃis! Cinco mil-rÃis! Cinco mil-rÃis!

TambÃm foi ligeiro. Fez a cota, chegou perto d'eu e disse: "O teu tà aqui..."

Eu disse: "Anselmo, passa a sanfona aà pra Pedro Minha Garrafa." Sanfona
na mÃo de Pedro Minha Garrafa, Zà de Bahia me deu os quarenta, eu saà com Karolina e Anselmo.

"Vamos contar o dinheiro, Anselmo. Ã vinte pra tu e vinte pra eu.
Eu vou contar, pronto. Um pra eu, um pra tu, um pra eu. Um pra eu, um pra tu, um pra eu.

Anselmo, besta, com as butuca em cima de Karolina, nem prestava atenÃÃo à minha c ontagem.

E eu tà lÃ: "Um pra eu, um pra tu, um pra eu. Um pra eu, um pra tu, um pra eu.
Pronto, Anselmo. Aqui tà o teu e aqui tà o meu. Agora tu vai voltar a tocar atÃ
de manhÃ, e guarda minha sanfona que eu amanhà eu vou buscar. E eu jà vou com Karolina."

Chegamos na banca de SÃ Marica. "SÃ Marica, cervejinha, cervejinha!" SÃ Marica
passou a cervejinha pra eu, nÃs bebemos, "Outra cervejinha!", bebemos a outra.
Aà jà tava mesmo perto dali, do pà de sombrinhÃo onde minha egÃinha tava amarrada.
Chegamos perto da egÃinha, acoxei a cilha, passei a perna, joguei Karolina
na garupa, saÃmos escondidos pelos fundos, fomos embora.

AÃ Karolina disse pra mim:

"Olha, Gonzaga! Puxa mesmo que a cabrueira vem aà atrÃs,
parece que eles tÃo querendo botar gosto ruim no nosso amor!"

"NÃo diga isso, Karolina!"

Salpiquei a espora no sovaco, no vazio dessa Ãgua. A egÃinha se abaixou... Saiu danada, chega saiu baixinho...

Piririco, piririco, piririco, piririco, piririco, piririco, epa! Escoramos na beira do rio.
O riacho tava cheio, rapaz. AÃ a Ãgua refugou Ãgua. "E agora, Karolina?"

"Vamos nos esconder dentro das moitas, aà por dentro do mato! "

NÃs entramos no mato, a negrada vinha atrÃs, riscou tambÃm na beira do rio.
NÃs escutamos o converseiro deles:

"Ã, sumiram... Se encantaram... Se escafederam. Vamos caÃar eles?"

"HÃme, vamos voltar pro samba, que ainda tem umas duas horas de forrÃ..."

"Ã mesmo, vamos voltar."

A cabrueira voltou, e nÃs trÃs ali dentro das moitas: eu, Karolina e minha Ãgua.

E ali nÃs trÃs, escutando a cantiga das Ãguas.

Tirei a sela e lavei a Ãgua.

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