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Re: [ABE-L]: Uma pequena provocação, para animar o sábado, um exto de um estatístico de renome, citaado um gigante, seu professor



Caríssimo Adilson:

Em primeiro lugar, agradeço sua atenção à minha diatribe. A intenção não foi 
captar elogios, mas o de lançar um tema à discussão. Muito bom, que V. tenha 
se manifestado contrariamente. A unanimidade é burra,  repetia Nelson 
Rodrigues. A ABE, em seu conjunto, está muito, muito longe disso! E V. não 
precisa desculpar-se por discordar de mim, agora ou em tempo algum. Se V. 
concordar comigo inteiramente, eu ficarei mais seguro, por respeitá-lo. Mas 
quando V. discordar e me mostrar seu pensamento, então me estará dando a 
oportunidade de aprender.

Peço desculpas por não ter sido claro e levá-lo a me entender erradamente. De 
modo algum, sou contra o trabalho em teoria. Sei muito bem que a distinção 
entre teoria e prática é vaga e cambiável. Mas meu ponto era outro.

Há uma enorme confusão entre matemática e estatística. A estatística não é um 
ramo de matemática. Diferentemente de álgebra, ou geometria ou até de 
probabilidades, a estatística não se encaixa na matemática. O fato de que a 
estatística usa muita matemática não a torna um ramo da matemática. Isso já 
foi discutido várias vezes aqui. Curioso é que não se diz que teoria de 
controle - um ramo da engenharia, é matemática. Essa é uma área que acompanho, 
como hobby. Teoria de controle usa muita matemática - e que matemática! Aliás, 
com apenas a mudança de nomes, muito do que se faz em TC é o que fazemos nós, 
estatísticos. Não vejo matemáticos, sem outra formação, dando aulas de teoria 
de controle na engenharia. Mas vejo vários ensinando na estatística. (Note que 
não me refiro à formação básica - sou a favor de liberdade nisso. Matemáticos, 
engenheiros, médicos podem ser estatísticos - desde que sejam estatísticos!).

A estatística tem teoria. E profunda, difícil, muitas vezes, de se acompanhar. 
Mas não é matemática. E trabalhar-se em problemas matemáticos, mesmo 
suscitados pela estatística, não faz de um matemático um estatístico. Um 
estatístico pode desenvolver soluções para problemas de estatística, usando 
matemática, e não será um matemático.

O que o Rubin disse é isso. Problemas matemáticos, per se, não são para 
estatísticos, que tem muito o que fazer para se ocupar disso. E há muito de 
"matemática" que se faz, em estatística inclusive, que nada mais é do que WFF 
("wófs), well formed formulae. Isto é, proposições que são feitas, desde o 
início, para serem demonstradas.  Um exemplo levantado por J. Wolfowitz, é 
teorema da fatoração. Wolfowitz afirmou que o conceito de suficiência, inventado 
por Fisher, e o teorema da fatoração, nada ganharam com a extensão de Halmos e 
Savage, usando o teorema de Radon-Nikodym. Cito Wolfowitz por que ninguém 
poderá dizer que foi um matemático fraco e que falava isso por despeito.

Acho que a estatística não cabe na matemática, tem corpo próprio. E até em 
atitude, temos mais a ver com engenheiros do que com ciências básicas, que são 
apenas nossos pilares. No passado, já dei murro em ponta de faca, ao sugerir 
que a estatística não deveria estar em faculdades ou institutos de matemática, 
como departamento. Para pegar um exemplo correlato, veja-se o exemplo da 
computação na UNICAMP. Quando era departamento do IMECC, na minha opinião, 
"tomava surras" da engenharia de computação, que trabalhava mais e melhor. Ao 
se separar e formar o Instituto de Computação, progrediu notavelmente. 

Era isso o que eu pensava, quando me animei com o texto do grande Rubin. Ele, 
um homem que tratava com rigor e cuidado o problema da causalidade em estudos 
observacionais (versus experimentais), sabia bem o que era estatística. De 
resto, apenas lancei o texto à lista, para provocar reações. O que virá daí, 
de gente mais capaz do que eu, me servirá de ensinamento.

Um bom domingo e um abraço,


Zé Carvalho

On Saturday 30 April 2011 23:44:11 you wrote:
> Caro Prof. Jose Carvalho,
> 
> Escrevo para você por um simples motivo: Respeito muito
> suas intervenções na lista da ABE e sei que o seu e-mail,
> provocador, digamos assim, terá muitos elogios.
> Nada contra. Isto deve fazer bem.
> Mas, gostaria, data venia, de dizer que discordo de você.
> A Teoria é a única atividade fim que nos cabe.
> A prática é, por exemplo, descobrir como os elefantes que seguravam
> o planeta, nos séculos anteriores ao século III, faziam para
> se alimentar e defecar sem deixar a Terra cair.
> Não existe a prática. O que existe é a tentativa de adequar nossa
> interpretação ao que modelamos.
> Um abraço,
> PS: Na prática não terá elogios unânimes!
> Abs
> A.S.