Fatores Sociais

     Nesta seção, procuraremos tratar alguns fatores sociais sobre os quais o software é responsavel , e como o software de código aberto age sobre os mesmos. Questões que abordaremos envolvem acesso de pessoas a recursos computacionais, e também impactos que certas decisões em software causam na sociedade, notadamente nas questões de privacidade e livre comércio.  


2.1) Como o software livre aumenta o acesso de pessoas a computadores

     Com o desenvolvimento tecnológico, o preço relativo dos computadores caiu substancialmente, e hoje , pelo mesmo que pagava-se anos atrás, obtém-se uma máquina muito mais poderosa . Iniciativas para aumentar o acesso de todos aos computadores são tomadas, incluindo a construção de equipamentos simplificados e de baixo custo. Mas o software proprietário é algo que mantém seus preços altos. Isso é um problema contornável por grandes empresas e organizações, mas atinge em cheio pessoas de menor renda, que mal possuem dinheiro para adquirir o equipamento, quanto mais para pagar altos valores por varias licenças de uso. Isso torna-se cada vez mais grave, pois pessoas estão sendo alijadas de participar do avanço tecnológico, tendo assim seu futuro comprometido, derivado de sua futura incapacidade de operar computadores. Aos que possuem poucos recursos, resta a alternativa da pirataria, frequentemente usada especialmente nos países mais pobres, ou abraçar o software livre ou de fonte aberta, certamente uma melhor opção. Por não requisitar o pagamento de taxas de licença, permite que se diminua o custo da obtenção de sistemas, limitando-o ao custo do hardware. Além disso, o software costuma ser de excelente qualidade, e por ser totalmente aberto, não alimenta o monopólio de uma empresa, permitindo que as pessoas adquiram conhecimentos utilizando ferramentas livres. Essa parece ser a opção ideal para pessoas ou organizações que possuem recursos financeiros limitados, como escolas públicas. Recentemente, escolas americanas da Filadélfia em fortes dificuldades financeiras foram ameaçadas de sofrer processos por utilizar ilegalmente o software pelo qual não podiam pagar. Ao final, fizeram um acordo de centenas de milhares de dólares para impedir o processo, que poderia acarretar na necessidade de pagamento de milhões de dólares às empresas proprietárias do software. Software de código aberto impediria esse problema.  


2.2) Liberdade em relação a padrões fechados

     Software proprietário muitas vezes vem acompanhado de padrões fechados. O objetivo do padrão fechado é permitir que apenas a empresa que desenvolveu o padrão possa utilizá-lo para criar produtos e serviços, excluindo assim seus competidores. O problema dos padrões fechados é que eles concentram muito poder na mão de uma única empresa, especialmente quando esta empresa usa esse artifício diversas vezes. Chegando a um extremo, para que possamos compartilhar informações, teríamos todos de usar software de uma única empresa, o que certamente caracteriza um monopólio. Se os padrões forem abertos, as empresas podem competir não em termos da posse ou não do padrão, mas em termos da qualidade e características de seus produtos e serviços.  


2.2.1) O caso MSN: Opiniões de Tim Berners-lee

     No dia 25 de outubro de 2001, quem tentasse acessar o serviço MSN, da Microsoft, com um navegador que não fosse o Internet Explorer receberia a mensagem que seu navegador não era compatível com o site, pedindo para que baixasse e utilizasse o Internet Explorer. Tal medida foi repudiada pela mídia, usuários e personalidades, o que forçou a Microsoft a rever a sua posição, permitindo o acesso ao portal através de outros navegadores. O argumento apresentado pela Microsoft era de que os outros browsers não implementavam os padrões definidos pelo Word Wide Web Consortium, W3C, entidade responsável pela elaboração de padrões WWW. Assim, a empresa estaria incentivando o uso de produtos enfatizados em padrões abertos.

Entretanto, Tim Berners-Lee, um dos idealizadores da Web, afirmou que, ao passar o código do Portal MSN, pelo validador da W3C, este acusou a não conformidade do site a certos padrões, no caso, XHTML. Portanto, o argumento apresentado pela Microsoft não procedeu.

Tim Berners-Lee ressaltou que a grande maioria dos browsers não implementa todos os padrões recomendados pela W3c, mas browsers que implementam boa parte dos padrões também foram impedidos de acessar o portal. Um fato curioso é que o browser Amaya, produzido pelo W3c para servir de controle e teste de suas tecnologias, e que, segundo Lee, implementa a maior parte dos padrões, tambem era impedido de acessar o portal.

Note a gravidade da questão: A web foi idealizada e construída para ser totalmente neutra a hardware e software, ou seja, é um padrão a qual todos, independente de plataforma de hardware ou sistema operacional, poderiam acessar. Entretanto, sabemos que isso não ocorre na prática. Frequentemente tentamos acessar sites que não carregam em certos browsers, mas carregam em outros. Isso é uma desvirtuação da Web, que tem como objetivo acesso universal as informações. Empresas tentam adicionar suas características próprias para "melhorar" a navegação, mas o que isso acaba causando é o impedimento da disseminação da informação.

Outro fato que deve ser levado em consideração é a aparente tentativa por parte da Microsoft de estender seu monopólio para a área de conteúdo. O que está ocorrendo é a tentativa de possuir toda a verticalização do negócio, ou seja, a geração de conteúdo e a forma de visualização do mesmo. Quando a AT&T cresceu mais do que a livre concorrência poderia suportar, foi dividida em várias empresas para estimular a concorrência no ramo da telefonia. É de se pensar se já não é prudente que se faça o mesmo com a Microsoft, em nome da livre concorrência e liberdade de escolha.
 


2.3) Problemas de privacidade advindos do software fechado

2.3.1) Tecnologias de Ativação de produtos

     Recentemente, a microsoft introduziu nas novas versões de seus produtos, a saber, Office XP e Windows XP, a tecnologia de ativação de produto. Basicamente lembra o antigo registro de software por senha, mas este esquema apresenta a peculiaridade de desativar o software caso o usuário realize muitas mudanças em seu hardware, como instalação de novo hardware ou re-instalação do sistema operacional.

Os mecanismos de proteção de cópia quase nunca se mostraram eficientes para combater a pirataria, especialmente a pirataria profissional, onde se copia ilegalmente milhares de CD's contendo software. Portanto, dificilmente esse esquema funcionaria para impedir tais pessoas. O objetivo da empresa é impedir a cópia casual, ou seja, o usuário que possui duas ou três máquinas e acaba por instalar a mesma cópia em todas, apesar de possuir só uma licença do software.

Os problemas advindos de tal esquema são evidentes. Acabarão por penalizar os usuários que adquiriram o software legalmente, que terão maior dificuldade em realizar mudanças nas suas configuracações, ou reinstalar o software em outra máquina no caso em que troque ou atualize seu hardware.
 


2.3.2) Passport

     Trata-se de um serviço de autenticação de usuários da Microsoft, que permite que usuários coloquem senhas e informações pessoais, como endereço e email em um único local, e utilize o serviço passport para autenticação em outros sites associados. Aparentemente é uma vantagem para o usuário, pois este não precisaria lembrar de dezenas de senhas e preencher cadastros todas as vezes com as mesmas informações. Mas tal serviço apresenta pontos negativos:  


     a) Sua informação fica concentrada nas mãos de uma entidade apenas: Todos nós, uma hora ou outra, acabamos por comprar algo pela internet ou preencher algum cadastro por algum motivo. A entidade que recebe o cadastro pode utilizá-lo para enviar propaganda, ou guardar históricos de nossas compras ou atividades em seu site, para futuramente oferecer-nos produtos e serviços que se assemelhem com nossas compras passadas. Isso é comumente usado por várias lojas online. Mas, com o serviço Passport, isso é sobremaneira potencializado, pois permite que o conjunto de sites Passport utilize informações em conjunto, para determinar o que deve ser vendido ou como deve ser oferecido para cada usuário. Isso ainda pode parecer inofensivo, mas imagine o seguinte exemplo: Suponha que dois sites façam parte da rede Passport: um de investimentos e um de venda de bilhetes aéreos. Suponha que, por fazerem parte da mesma rede de informações, os responsáveis pelo site de venda de passagens decidam oferecer tarifas maiores para quem tem mais dinheiro investido. Pode parecer um exemplo paranóico, mas esse sites existem na rede passport: Investor e Expedia. O que os impede de adotarem tais práticas? Absolutamente nada.  


     b) Sua informação fica concentrada nas mãos de quem já concentra muito poder: A Microsoft possui o domínio do software utilizado em sistemas caseiros. Isso é uma grande vantagem competitiva, pois permite que, juntamente com o software, ofereçam outras comodidades para o usuário, o que certamente torna a empresa ainda mais poderosa. É a consolidação de um monopólio e o início da criação de outro.  


     c) Voce lê a licença de uso? : Muitos usuários não lêem as licenças de uso dos serviços que acessam, clicando no botão "Aceito" automaticamente. No início do ano, alguem foi ler o que dizia o termo de uso. Basicamente, dizia que qualquer informação que você enviasse para o Passport ou algum de seus sites associados, passaria a pertencer a Microsoft, que reservaria a ela todos os direitos de uso da mesma. O que dizer de um contrato desses? (Veja os links para os sites que noticiaram tal fato, e os trechos da licença de uso).  


     d) Único ponto de falha: Com todas as suas informações em um único lugar, cria-se um único ponto de falha, sujeito a ataques por pessoas mal intencionadas. Estes poderiam ter acesso a suas informações pessoais, além de números de cartão de crédito. Paranóia? Não. De fato, existia essa vulnerabilidade no serviço (Veja seção de links para mais detalhes).  


     e) Extendendo o problema: HailStorm: HailStorm é uma proposta de serviço da Microsoft que possibilita que um usuário mantenha seus arquivos em servidores na rede Internet, acessíveis de qualquer lugar. Apresenta os mesmos problemas que o Passport, só que extendido, porque a gama de informações disponíveis será muito mais ampla.  



"Linkografia":



Artigo:
Does Issuing Passports Make Microsoft a Country?
Comentários: Discute a operação Passport, da Microsoft, e porque o considera prejudicial


Artigo: What's Wrong With Copy Protection
Comentários: Discute aspectos negativos dos esquemas de protecao de cópia, incluindo o desrespeito ao "Fair Use", entre outros


Artigo: Microsoft backpedals on MSN browser block
Comentários: Discute a reação da Microsoft ao infame bloqueio dos navegadores concorrentes


Artigo: Microsoft storm warning
Comentários: Discute os problemas que Hailstorm pode apresentar para seus usuários


Artigo: The trouble with Hotmail
Comentários: Discute problemas do Hotmail e Passport, incluindo sua estranha licença que acompanhava o serviço no início do ano


Artigo: Tim Berners-Lee on Microsoft's Latest Browser Tricks
Comentários: Opinioes de Tim Berners-Lee sobre o bloqueio dos browsers não criados pela Microsoft


Artigo: MS Passport: "All Your Bits Are Belong To Us"
Comentários: Discute a estranha licença que acompanhava o servico Passport no início do ano


Artigo: Stealing MS Passport's Wallet
Comentários: Explica o grave problema de segurança apresentado pelo servico Passport


Artigo: What's Wrong With Product Activation
Comentários: Criticas à tecnologia de ativação de produtos presentes no Windows XP e Office XP


Artigo: Microsoft to schools: Give us your lunch money!
Comentários: Problemas enfrentados por escolas americanas por utilizar software sem licença