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Re: [ABE-L]: Três pontos



Colegas,
 
Muito bom ver o assunto retomado.
 
Sou da corrente minoritária que defende o reforço da identidade da Estatística como área autônoma de produção de conhecimento, distinta da Matemática (e da Computação, e da Engenharia, etc., para não ficar parecendo preconceito). Conseqüentemente, defendo a criação de comitê próprio no ambiente do CNPq e em outros onde a questão se manifestar. A minha visão de futuro para a Estatística é a do LAGÃO...
 
Dois pontos específicos para contribuir com o debate.
 
O Renato defende que as publicações a considerar para avaliar produtividade em pesquisa nesta área devem ser "revistas de Estatística". Posso estar de acordo com esta posição ou não, dependendo do que as pessoas entenderem como revista de Estatística. Alguns anos atrás a revista Survey Methodology, um periódico científico de ótimo nível (na minha modesta opinião) não figurava entre as "revistas de Estatística" consideradas para avaliação da produtividade em pesquisa na nossa área. Não sei dizer se agora a situação mudou, mas se não mudou, não posso concordar com a proposta do Renato.
Minha opinião é de que se quisermos de fato definir uma identidade da Estatística que justifique sua saída para um espaço autônomo, distinto da Matemática (daqui por diante fico com este exemplo só porque no momento é onde estamos inseridos), temos que debater e estabelecer um consenso sobre o que Estatística quer dizer para um grupo suficientemente amplo e forte na comunidade brasileira. Conheço a opinião do Renato, e ele a deixa clara com o exemplo que cita em sua mensagem, mas esta não parece refletir a opinião da maioria. Se só artigos tipo 'Annals of Statistics' puderem contar, não haverá futuro para uma área autônoma da Estatística e será melhor ficarmos encolhidos junto com a Matemática.
O segundo ponto é para reforçar o argumento do Renato em relação à situação da Estatística no ambiente das Universidades. Aqui na Inglaterra, nas universidades onde Estatística é forte, há departamentos autônomos de Estatística, e em várias delas, estes não ficam sequer no mesmo instituto da Matemática. Aqui em Southampton criaram em 2003 o "Southampton Statistical Sciences Research Institute" (quem conhece a ENCE nota que o nome é uma tradução de "Instituto de Pesquisa em Ciências Estatísticas de Southampton" e pode até achar curioso que a ENCE tenha precedido Southampton em 50 anos com a escolha do seu nome... Desculpem, não resisti à tentação... ). É um grupo que surgiu da aglutinação de três grupos menores: um que ficava na Matemática, um que ficava na Estatística Social e outro que ficava na área de Estatística Médica.
 
Então o que os une agora é a Estatística, a identidade do trabalho de pesquisa nesta área, que eu penso que depende de conhecimentos de Matemática, mas também de outros, como de computação, por exemplo.
 
Para finalizar, uma citação de um livro recente que recomendo aos pares e seus alunos:
"Bacon had to overcome the attitude that human dignity suffered from involvement with lowly material things. ... Funnily enough, we find exactly the same kind of attitude still reflected in certain modern sciences. In particular, those sciences and technologies which have a mathematical basis, such as physics, statistics and computer science, one often finds that the most highly regarded pieces of work are amongst the most abstract, and that the most highly regarded journals are those which publish the more theoretical and abstruse material, far from direct practical applications. This is despite the fact that those articles mostly directly concerned with practical applications are likely to yield the most striking benefit. Plus ça change..." - O autor é David J. Hand, atual presidente da RSS, a citação é da página 42 do livro "Information generation: how data rule our world".
 
Mantive o texto em inglês, sem tradução, porque acho importante passar com exatidão o pensamento do autor.
 
Então, caríssimos, ao debate.
 
Pedro.
 
 
 
 

 
2008/4/25 Renato Martins Assuncao <assuncao@est.ufmg.br>:
As perguntas relevantes, contudo, parecem-me ser: O que fazer? Que caminhos tomar? Os caminhos alternativos são melhores que o statu quo? Que riscos eles embutem? São factíveis, viáveis, realistas?
Acho que estas sao as ultimas peguntas que devem ser respondidas ao
final do processo de discussao. Porque as respostas dependem
fundamentlamente de quanta forca politica e consenso podemos ter em
torno de alguma proposta. Como nao existe nada disso, nao acho que valha
a pena a discussao destes pontos **no momento**.

Cabe algum papel à ABE nesse cenário?
Eu nao tenho nenhuma duvida de que sim.
Nos estatutos da ABE lemos:
(f) zelar pela liberdade de ensino e da pesquisa, bem como, pelos
interesses científicos e profissionais da área de Estatística no Brasil;


Existem outros pontos que podem ser usados para justificar a acao da ABE.
Que tidpo de acao? Fomentar o debate aqui na lista, no sinape,
nos depto de estatistica, nos periodicos e revistas.
Conversar junto a outras associacoes para sensibilizar, convencer ou
ouvir argumentos acerca da criacao ou nao de um comite proprio
de estatistica ou do aumento de bolsas.

Na verdade, todas as associacoes fazem isso ao zelar pela crecsimento
acadmeico de suas areas de pesquisa. Nao por corporativismo, obvio,
mas porque e' bom para pais. O Brasil precisa de tudo: genetica, engenharia,
computacao, servico social e estatistica. 

Os caminhos da estatística devem estar atrelados aos da
probabilidade?
Nao vejo como um principio que elas tenham de ficar juntas.
Pra dizer a verdade, eu acho que, tendo de escolher entre ficar com estatistica
ou com matematica, a maioria dos probahilistas ficara com a matematica.
E' natural, e' o que eu faria se fosse probabilista.

Nos nao somos probabilistas nem matematicos. Eu vejo o que eu faco como
muito mais proximo do que as pessoas de computacao e a engenharia fazem
do que o que os matematicos fazem.


Devemos nos esforcar para que essas duas áreas não se
dissociem?
Deveriamos avaliar se sair e' bom para nós, estatisticos.
Se for melhor, podemos ver se  para eles e' tambem mais  vantajoso
sair do comite de matematica. Acho que nao seria.

Eu nao chamaria isso de divorcio. O crescimento de areas requer a cosntituição
de comitês separados. Probabilistas sentem-se a vontade dentro de
deptos de matematica ou de estatistica. Estatisticos hoje em dia dificlmente
conseguem viver bem dentro de um depto de matematica, as atividades
ja ficaram distintas demais. Aqui e no exterior. Na verdade nos EUA,
os bioestatisticos ja constitiram deptos separados de estatistica.

Ate pouco tempo atras nao existia depto de computacao autonomo no Brasil.
HOje e' impensavel nao existir um depto completamente separado de matematica,
estatistica, etc. Na veradde, eles agora ja brigam para  tornarem-se INSTITUTOS
dentro das universidades. Com sucesso, diga-se de passagem.


Como, especificamente, deveria ser feita a avaliacao da
producão científica em nossa área? Publicacões em periódicos de outras
áreas devem receber a mesma valoracão de publicacões em periódicos de
nossa área no que tange à concessão de bolsas de pesquisa pelo CNPq e
avaliacão de programas de pós-graduacão pela CAPES?

Este ponto merece debate sim. E nao entendo porque existe resistencia em
discutir as questoes que já são usadas para avaliar as nossas atividades ou
que, na eventual criacao de um comite, teriam de ser criadas para avaliar
as atividades de pesquisa.

Eu já expressei minha opinião antes. Papers em revistas de estatistica sao a essencia
do trabalho de pesquisador em estatistica. CAsos excepcionais devem ser avaliados
como tais. Mas o grosso tem de ser avaliado em cima de revistas de estatistica.
Metade de minha producao nao e' em revistas assim. Publico em medicina,
demografia, etc. e continuarei fazendo isto, mesmo sem valer muita coisa no
comite de estat do CNPq. Que fique claro:
eu NÃO estou questionando essa orientacao do comite!!

Como estatistica evolui, devemos estar atentos a isto. Existem revistas que
sao otimos lugares para publicacoes estatisticas: os IEEE, os bons jornais de
computacao, de pesquisa operacional, etc. Algumas tecnicas de analise de dados
estao sendo criadas e desenvolvidas mais e melhor fora das revistas de estatistica.
Estes tambem deveriam ter um peso significativo na avaliacao. Sao papers
metodologicos, que exigem grande conhecimento de probab, estat, computacao
etc.

Artigos onde a contribuicao para o avanco do conhecimento estatistico é marginal
não deveriam ter um grande peso. O conhecimento estatistico pode e deve incluir.
por exemplo, novas formas de amostragem relevantes para o Censo Brasileiro,
trabalho que o Jose Carlos Pinheiro e o Matias fizeram anos atras.

Uma pergunta adicional: Que argumentos podem ser usados junto ao CNPq com vistas ao aumento do número de bolsas em nossa área? Há argumentos
quantitativos capazes de ter desdobramentos junto ao CNPq? Quais seriam?
Antes deveriamos ver se chegamos a um consenso sobre o que seria pesquisa
estatistica nesse eventual comite. Sem esclarecer isso, eu acho dificil prosseguir.
E' uma pena que tao poucos se manisfestem. E pior, sempre os mesmos, um pequeno
grupo de bolsistas de produtividade que não tem muito que ganhar
diretamente caso o comitê seja criado (a não ser o ganho indireto pelo
crescimento da área).

Como diz o Gauss, e' o que doi, pois isto mostra o tamanho da comunidade que
queremos ser. Uma vez o Paul Halmos disse que você podia optar entre duas
opções: ser o sapinho do lagão ou o sapão do laguinho.

Saudações,
Renato Assunção




--
Pedro Luis do Nascimento Silva
Southampton Statistical Sciences Research Institute
University of Southampton
Highfield
Southampton, SO17 1BJ, UK
Tel: 44-23-80597169
Fax: 44-23-80595763
Alternate e-mail: pedrolns@soton.ac.uk