[Prévia] [Próxima] [Prévia por assunto] [Próxima por assunto]
[Índice cronológico] [Índice de assunto]

Re: [ABE-L]: Um caso



Caros redistas,

Para os que não conhecem, há um livro muito interessante, escrito em 1988,
chamado "Innumeracy: mathematical illiteracy and its consequences", de
John Allen Paulos. Embora o livro seja voltado essencialmente para a
sociedade americana, o fenômeno que o autor descreve (incapacidade de uma
grande parte da população de desenvolver e entender conceitos matemáticos
e estatísticos) certamente se aplica à maior parte das sociedades
modernas.

Sugiro lerem o capítulo 5, dedicado à compreensão da Estatística.

O autor ilustra seus comentários com exemplos muito interessantes, como,
por exemplo, logo na introdução, o do jornalista na televisão americana
responsável pela previsão do tempo que anunciou que havia 50 por cento de
chance de chover no sábado e 50 por cento de chance de chover no domingo,
logo, cem por cento de chance de chover no fim de semana...

Abraços...


>     Se formos falar de probabilidades aplicadas a eventos esportivos,
> poderemos escrever um livro com centenas de páginas de "causos"...
>
>     Em 2006, antes do início das quartas-de-finais da Copa do Mundo, fui
> entrevistado por um repórter do site oficial de um conceituado
> comentarista
> político-econômico. As perguntas, previsíveis, eram sobre as
> probabilidades
> de o Brasil vencer a França nas quartas e, posteriormente, de conquistar o
> título.
>     Minhas respostas (lembro-me até dos números) foram: o Brasil tem 64%
> de
> probabilidade de se classificar para as semifinais, contra 36% da França.
> E
> das oito seleções quadrifinalistas, o Brasil tinha a maior probabilidade
> de
> conquista de título: 32%.
>     Pois bem, poucos dias depois o Brasil foi derrotado no célebre jogo do
> meião do Roberto Carlos e, no dia seguinte ao jogo, recebi telefonema do
> próprio titular do site, querendo fazer uma nova entrevista para que eu me
> explicasse, pois, segundo ele, eu havia afirmado que o Brasil ia ganhar da
> França e que seríamos hexacampeões naquela Copa!
>     Ainda tentei argumentar que, se havia 32% de chances de o Brasil
> vencer
> a Copa, então havia 100 - 32 = 68% de chances de o Brasil NÃO vencer a
> Copa,
> mas o eminente jornalista só soube dizer algo como "não vem com desculpas,
> você disse que o Brasil ia ganhar e o Brasil perdeu, você errou"...
>
> Marcelo
>
> ----- Original Message -----
> From: <asimonis@ime.usp.br>
> To: "Alejandro C. Frery" <acfrery@gmail.com>
> Cc: "Jose F. de Carvalho" <carvalho@statistika.com.br>; "ABE Lista"
> <abe-l@ime.usp.br>
> Sent: Tuesday, May 15, 2012 6:51 PM
> Subject: Re: [ABE-L]: Um caso
>
>
>
>
>
> Caros, relato um ¨causo¨ tal como me contaram...
>
> Um colega matemático, recém chegado ao Brasil no final de seu programa
> de doutorado, recebeu uma solicitação de entrevista por parte de
> um jornalista. Tratava-se de estimar as chances de vitória que
> o piloto Ayrton Senna teria faltando 3 corridas para a final do
> mundial de fórmula 1.
> Jovem doutor, com paciência, explicou ao jornalista todas as
> possibilidades,
> tais como ficar em segundo ou terceiro lugar, Alan Prost ir para o
> pódium, e assim por diante. Foram 3 horas de entrevista para exaurir
> as possibilidades e estimar a chance de campeonato do Senna.
> No dia seguinte, o jornal de grande circulação anunciava em Manchete:
> Jovem Matemático, recém-vindo da França, estima que quanto mais corridas
> o Senna vencer, maior a chance de ser campeão!!
>
> Abs
>
>
>
>
>
>
>
>
>
> Citando "Alejandro C. Frery" <acfrery@gmail.com>:
>
>> Caríssimos redistas,
>>
>> Minha singela contribuição para esse fascinante assunto das
>> entrevistas data de quando eu trabalhava no CIn da UFPE.
>>
>> Me ligaram de um jornal local pedindo uma entrevista sobre "compressão
>> de dados". Preparei uma apresentação ilustrada com os primeiros
>> minutos de "8½", do grande Fellini, que usa a Cavalgada da Walkíria,
>> de Wagner, como fundo musical. Fiz todas as contas bem fáceis de
>> acompanhar: o tamanho de cada imagem em pixels, o espaço que cada
>> pixel ocupa para arquivar um tom de cinza, o espaço necessário para
>> conter esse trecho musical, para, finalmente, comparar esse volume
>> teórico necessário com o volume real ocupado pelo arquivo em disco.
>> Voilà, a mágica da compressão de dados estaria justificada...
>>
>> Antes de chegar à metade da minha apresentação a jornalista me
>> interrompeu e disse, com a uma expressão de tédio inesquecível, algo
>> assim: "Mas o que eu quero é que o senhor conte como se instala o
>> Winzip".
>>
>> Infelizmente não fui de utilidade nenhuma. Não usava (nem uso) Windows.
>>
>> Alejandro
>>
>> 2012/5/15 Jose F. de Carvalho <carvalho@statistika.com.br>:
>>> Sobre entrevistas, tenho um "causo". Bom para contar em roda de
>>> chopp...
>>> mas
>>> vá lá.
>>>
>>> Em 1978, recém chegado dos EUA, fui a João Pessoa, em um congresso da
>>> Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (acho que era essa a
>>> sociedade),
>>> para receber o Prêmio Gerhard Domack, ganho por um artigo publicado na
>>> revista da sociedade. Esse prêmio era patrocinado por uma farmacêutica,
>>> de
>>> modo que tudo foi feito à la grande bouffe. Uma festa e tanto! Entre
>>> tantas
>>> atividades, fui protagonista de uma entrevista coletiva. O assunto era
>>> esquistossomose e eu temia sair mal na fotografia...
>>>
>>> Entre mil perguntas sobre a pesquisa e sobre esquistossomose em geral,
>>> havia
>>> uma repetida insistentemente por uma jornalista local. A pergunta era
>>> repetida sempre do mesmo jeito: "O senhor, como cientista, é a favor da
>>> anistia ampla, geral e irrestrita?" Eu lhe disse, mais uma de vez, que
>>> não
>>> responderia à questão, por estar fora do tema. Mas ela insistia... e
>>> insistia! Ao fim, lembro que lhe disse algo para expressar: "Olhe, eu
>>> estava
>>> fora do Brasil por quatro anos, nada sei do que está ocorrendo. Além do
>>> mais, não sou um cientista, muito menos ainda tenho mandado dos
>>> cientistas
>>> do Brasil para falar por eles. Não responderei a sua pergunta!" Estou
>>> seguro
>>> de haver sido taxativo.
>>>
>>> Dessa entrevista, tenho guardados vários recortes de jornal. Tudo que
>>> falei
>>> sobre o assunto propriamente saiu errado em quase todos os jornais, por
>>> óbvia falta de entendimento do assunto pelos jornalistas. A exceção foi
>>> Ethevaldo Siqueira, do Estadão, que entendeu e conseguiu reproduzir
>>> minhas
>>> declarações à perfeição para seus leitores. Cômica foi a manchete do
>>> jornaleco local, que peguei no dia seguinte. Dizia: "Cientista aprova
>>> anistia, ampla, geral e irrestrita". A jornalista pode haver lido meus
>>> pensamentos, mas não reproduziu minhas palavras na entrevista.
>>>
>>> E sobre matérias técnicas de estatística, tenho vários outros exemplos
>>> de
>>> deturpações de minhas declarações, mesmo se dadas por escrito. As
>>> deutrpações foram causadas por evidente falta de entendimento do
>>> assunto
>>> pelos jornalistas. Bem... em estatística, área onde muitos praticantes
>>> e
>>> alguns "teóricos" não tem a menor ideia do método, isso não surpreende.
>>> Fique registrado o caveat do Carlinhos: cuidado com entrevistas!
>>>
>>> Abraços,
>>>
>>> Zé C.
>>
>>
>>
>> --
>> Alejandro C. Frery
>> Maceió, AL - Brazil
>> http://sites.google.com/site/acfrery/
>> http://www.researcherid.com/rid/A-8855-2008
>>
>>
>
>
> Adilson Simonis <asimonis@ime.usp.br>
>