4 Matrizes e Sistemas Lineares
Com a linguagem das operações com matrizes, podemos escrever o sistema (2) em notação matricial: \(Ax=b\), onde
Além dessa representação, podemos utilizar as operações matriciais para interpretar geometricamente, e de duas maneiras, um sistema linear. Neste primeiro momento faremos o caso de sistemas \(2\times 2\). Para isso, precisamos do conhecimento das equações de retas no plano cartesiano, ou seja, da representação gráfica do conjunto solução de equações do tipo \(ax+by=c\) e algum conhecimento básico de vetores, como o estudado para Física no ensino médio. Futuramente seremos capazes de intpretar geometricamente sistemas com \(3\) variáveis e, com um pouco de abstração, enxergar a situação em \(n\) variáveis!
Interpretação por linhas: Considerando o sistema \(\left\{ \begin{aligned} ax+by& =c\\ dx+ey& =f \end{aligned}\right.\), nas variáveis \(x\) e \(y\), temos que o conjunto solução de cada equação separadamente é uma reta e, portanto, o conjunto solução do sistema é a interseção dessas duas retas. Vejamos todas as possibilidades em exemplos concretos:
\(\left\{ \begin{aligned} 2x+3y& =7\\ x-y& =1 \end{aligned}\right.\) tem solução única:
\(\left\{ \begin{aligned} 2x+3y& =1\\ 4x+6y& =2 \end{aligned}\right.\) tem infinitas soluções:
\(\left\{ \begin{aligned} 2x+3y& =1\\ 4x+6y& =12 \end{aligned}\right.\) não tem soluções:
Interpretação por colunas: Usando a operação multiplicação entre matrizes e escalares, podemos escrever o sistema \(\left\{ \begin{aligned} ax+by& =c\\ dx+ey& =f \end{aligned}\right.\) como uma equação matricial:
Identificando as matrizes coluna com vetores no plano cartesiano, ou seja \( \begin{bmatrix} a \\ b \end{bmatrix}\sim \vec{u}=(a,b)\) e \( \begin{bmatrix} c \\ d \end{bmatrix}\sim \vec{v}=(c,d)\), essa equação pergunta se é possível, partindo da origem, chegar ao ponto \((e,f)\), andando somente em direções paralelas aos vetores \(\vec{u}\) e \(\vec{v}\). Vejamos essa interpretação nos exemplos acima:
\(\left\{ \begin{aligned} 2x+3y& =7\\ x-y& =1 \end{aligned}\right.\sim x \begin{bmatrix} 2 \\ 1 \end{bmatrix}+y \begin{bmatrix} 3 \\ -1 \end{bmatrix}= \begin{bmatrix} 7 \\ 1 \end{bmatrix}\):
Futuramente vamos justificar exatamente tudo o que está acontecendo aqui dentro da teoria de vetores. Note que a indicação das variáveis \(x\) e \(y\) não estão mais nos eixos. Por que será?
\(\left\{ \begin{aligned} 3x+2y& =2\\ 6x+4y& =1 \end{aligned}\right.\sim x \begin{bmatrix} 4 \\ 2 \end{bmatrix}+y \begin{bmatrix} 6 \\ 3 \end{bmatrix}= \begin{bmatrix} 2 \\ 1 \end{bmatrix}\):
Aqui é possível atingir o ponto \((2,1)\) de infinitas maneiras: para cada número real \(\lambda \), tomando \(x=\lambda \) e \(y=\dfrac {2-3\lambda }{2}\) teremos uma solução.
\(\left\{ \begin{aligned} 3x+2y& =12\\ 6x+4y& =1 \end{aligned}\right.\sim x \begin{bmatrix} 3 \\ 6 \end{bmatrix}+y \begin{bmatrix} 2 \\ 4 \end{bmatrix}= \begin{bmatrix} 12 \\ 1 \end{bmatrix}\):
Aqui é impossível atingir o ponto \((1,2)\) andando apenas na direção dos vetores \((6,3)\) e \((2,4)\), evidenciando que o sistema não solução.
Passamos agora a uma abordagem ingênua para tentarmos analisar sistemas lineares. Iniciamos com o caso mais simples, ou seja, \(m=n=1\). Nesse caso, o sistema é \(ax=b\), onde \(a,b\in \mathbb {R}\). Temos casos a analisar:
se \(a\neq 0\), então existe \(\dfrac {1}{a}=a^{-1}\in \mathbb {R}\) tal que \(a^{-1}a=1\) (elemento neutro da multiplicação, análogo à matriz identidade). Dessa forma
\[ ax=b\implies a^{-1}(ax)=a^{-1}b\implies (a^{-1}a)x=a^{-1}b\implies 1x=a^{-1}b\implies x=a^{-1}b=\dfrac {b}{a}, \]é a única solução da equação!
se \(a=0\), então não existe \(a^{-1}\) como acima. A equação aqui assume \(0x=b\), que só tem solução se \(b=0\) (em que qualquer \(x\in \mathbb {R}\) é solução).
Queremos imitar isso no caso geral: escrevemos um sistema \(m\times n\) na forma matricial \(Ax=b\), onde \(A\in M_{{m}\times {n}}(\mathbb {R})\), \(b\in M_{{m}\times {1}}(\mathbb {R})\) são respectivamente a matriz de coeficientes e de termos independentes, enquanto \(x\in M_{{n}\times {1}}(\mathbb {R})\) é a matriz com as incógnitas. Para resolver esse sistema, procuramos uma matriz que faria o papel de inverso multiplicativo (à esquerda). Se \(Y\) é tal matriz, então teremos
Ainda não temos um método geral para determinar a matrix \(Y\) acima, mas vamos experimentar isso num caso concreto.
Considere o sistema
Queremos uma matriz \(Y= \begin{bmatrix} k & l \\ m & n \end{bmatrix}\) tal que
Podemos verificar diretamente que a matriz \(Y= \dfrac {1}{ad-bc} \begin{bmatrix} d & -b \\ -c & a \end{bmatrix}\) atende à propriedade desejada. De sua expressão fica claro que \(Y\) só existe se \(ad-bc\neq 0\). Esse número é determinante 1 para garantir a existência dessa inversa.