9.4 Teorema do Limite Central de Lindeberg
Nesta seção provaremos a versão mais geral do Teorema do Limite Central no contexto de sequências de variáveis independentes, o chamado Teorema de Lindeberg.
Ao longo desta seção, sempre suporemos que é sequência de variáveis aleatórias definidas em um mesmo espaço de probabilidade, para cada denotamos , , , e assumiremos que .
Definição 9.8 (Condição de Lindeberg).
Dizemos que a sequência de variáveis aleatórias satisfaz à condição de Lindeberg se
para todo .
Agora estamos prontos para enunciar o Teorema de Lindeberg.
Teorema 9.9 (Teorema de Lindeberg).
Seja uma sequência de variáveis aleatórias independentes. Se a condição de Lindeberg é satisfeita, então
Ao final desta seção, enunciaremos uma versão mais geral, em que as variáveis que compõem serão denotadas porque podem ser diferentes para cada .
Demonstração do Teorema 9.1.
Basta verificar que, no caso i.i.d. com segundo momento finito, a condição de Lindeberg é satisfeita. Escrevemos e , assim . Usando o Teorema da Convergência Dominada,
pois quando . ∎
Para o Teorema do Limite Central de Lyapunov, obtemos a versão abaixo que é mais geral do que aquela provada na Seção 9.3.
Corolário 9.10 (Teorema do Limite Central de Lyapunov).
Seja uma sequência de variáveis aleatórias independentes. Se existe tal que
então
Demonstração.
Observe que
para todo e, portanto, vale a condição de Lindeberg. ∎
Apesar de ser mais simples de ser verificada na prática, a condição de Lyapunov é mais restritiva que a de Lindeberg, como vemos no seguinte exemplo.
Exemplo 9.11.
Seja uma sequência de variáveis aleatórias i.i.d. com distribuição comum para todo , onde é a constante tal que . Podemos verificar que , logo a sequência satisfaz à condição de Lindeberg conforme visto na demonstração do Teorema 9.1. Por outro lado, para todo , portanto a condição de Lyapunov nunca é satisfeita. ∎
A condição de Lindeberg é uma forma de quantificar a ideia de que a contribuição de cada parcela na soma é pequena quando se torna grande. Mais precisamente, ela diz que as contribuições para a esperança do desvio quadrático, mesmo quando somadas, provêm de desvios relativamente pequenos se comparados com o desvio-padrão de . A proposição abaixo diz que, neste caso, a contribuição de cada parcela na variância de é desprezível.
Proposição 9.12.
Seja uma sequência de variáveis aleatórias satisfazendo à condição de Lindeberg. Então, .
Omitimos a prova pois será um caso particular da Proposição 9.15.
Exemplo 9.13.
O exemplo acima ilustra que a condição de Lindeberg não é necessária para que valha a conclusão do Teorema do Limite Central. O Teorema de Feller, que enunciaremos abaixo sem prova, diz que esse tipo de exemplo somente pode ocorrer quando é responsável por uma fração não-desprezível de . A prova desse teorema encontra-se na Seção III.4 de [SHI96] ou na Seção XV.6 de [FEL71].
Teorema 9.14 (Teorema de Feller).
Seja uma sequência de variáveis aleatórias independentes. Se e quando , então a condição de Lindeberg é satisfeita.
Concluímos esta seção com a versão do Teorema de Lindeberg para arranjos triangulares de variáveis aleatórias. Para isso, a partir de agora consideremos uma família de variáveis aleatórias da forma . Definimos , , e .
Dizemos que o arranjo satisfaz à condição de Lindeberg se
para todo .
Observe que, dada uma sequência de variáveis aleatórias satisfazendo à condição de Lindeberg para sequências, definida no início desta seção, podemos definir a família por , e esse arranjo satisfará à condição de Lindeberg para arranjos triangulares, definida logo acima. Assim, o Teorema 9.9 é corolário desse que enunciaremos e provaremos mais abaixo. Para isso, vamos precisar da seguinte generalização da Proposição 9.12.
Proposição 9.15.
Seja um arranjo triangular de variáveis aleatórias satisfazendo à condição de Lindeberg. Então,
Demonstração.
Defina para . Dado qualquer ,
Como a condição de Lindeberg é satisfeita,
o que conclui a prova dessa proposição. ∎
Teorema 9.16 (Teorema de Lindeberg para arranjos triangulares).
Seja um arranjo triangular de variáveis aleatórias independentes. Se a condição de Lindeberg é satisfeita, então
Demonstração.
Sem perda de generalidade, podemos supor que e para todos e . Queremos mostrar que . Pelo Teorema de Helly-Bray, é suficiente mostrar que , para toda função tal que são contínuas e limitadas, onde . Fixe com tais propriedades.
Seja um arranjo triangular de variáveis aleatórias independentes entre si, independentes de e tais que . Tomando um espaço produto, podemos supor que todas essas variáveis estão definidas no mesmo espaço de probabilidade que . Observe que, para todo ,
donde
Fixado , para cada , defina a variável
e observe que e . Observando também que , obtemos
A ideia é mostrar que, ao trocarmos as variáveis da sequência pelas de , uma de cada vez para , a distância entre e será pequena, mesmo depois de somar sobre .
Defina como
Pela Fórmula de Taylor com resto de Lagrange de terceira ordem,
para algum . Como é limitada, existe constante , tal que para todo .
Agora, pela fórmula de Taylor com resto de Lagrange de segunda ordem,
para algum . Novamente, como é limitada, existe uma outra constante tal que para todo . Essa cota é melhor que a anterior quando não é muito pequeno.
Por outro lado, a partir da definição de , podemos verificar que
Aplicando à diferença das esperanças que queremos estimar, usaremos as cotas acima com , , e . Da desigualdade acima,
Observe que é independente de e . Como , as parcelas envolvendo e na estimativa acima são nulas. Portanto,
Dessa forma, para concluir a demonstração basta mostrar que
Comecemos pelo primeiro limite. Seja . Vamos estimar separando valores de pequenos dos demais:
Na primeira desigualdade, utilizamos a cota para a primeira integral e para a segunda. Somando em , tomando o limite e usando a condição de Lindeberg, obtemos
Como a desigualdade acima é válida para todo ,
Para a estimativa do segundo limite, com no lugar de , procedemos de modo idêntico e obtemos
Apesar de não sabermos de antemão se satisfaz à condição de Lindeberg, podemos fazer a seguinte estimativa
pois como vale a condição de Lindeberg para , podemos evocar a Proposição 9.15. Isto mostra que
o que conclui a prova do Teorema de Lindeberg. ∎