3.3 Variáveis aleatórias absolutamente contínuas
Seja uma função não-negativa e contínua por partes. Dizemos que uma variável aleatória , sua função de distribuição e sua lei são absolutamente contínuas com densidade se
para todo intervalo . Neste caso, dizemos que é uma função de densidade de probabilidade de , ou simplesmente uma função de densidade de .
No tratamento de variáveis aleatórias que possuem densidade, tudo pode ser feito em termos de integrais. A função de distribuição de uma variável aleatória absolutamente contínua com densidade é dada por
(3.25) |
Exemplo 3.26.
Sortear um número em . Definimos
e assim
Se suspeitamos que uma variável aleatória possui densidade, podemos obter um candidato a densidade calculando
Depois podemos confirmar se é de fato uma função densidade de verificando (3.25).
Note que a função pode não ser diferenciável em todos os pontos, como a do exemplo acima que não é diferenciável em ou . Porém, o valor de nestes dois pontos não importa pois não afetam o valor da integral. Por certo, nos cálculos referentes à variável aleatória , a função sempre aparece dentro de uma integral, e se modificamos em um conjunto finito de pontos, obtemos outra função de densidade para sem que isso cause nenhum tipo de problema.
Se é uma função satisfazendo
diremos que é uma função de densidade. Dada uma função de densidade , sempre podemos definir uma função de distribuição pela fórmula (3.25), logo, pelo Teorema 3.17, existe uma variável aleatória definida em algum espaço de probabilidade e que tem como sua função de densidade.
A seguir descreveremos alguns dos exemplos mais importantes de variáveis aleatórias absolutamente contínuas. Obviamente há outras, não descritas aqui e que também são muito importantes, sobretudo em Estatística.
Distribuição uniforme
Dizemos que a variável aleatória tem distribuição uniforme no intervalo , denotado por , se
A distribuição uniforme é a distribuição absolutamente contínua mais simples. Segundo esta distribuição, a probabilidade de estar em um dado subintervalo de depende apenas do comprimento desse subintervalo.
A distribuição uniforme pode ser pensada como o limite de uma distribuição uniforme discreta em , quando é muito grande.
Exemplo 3.27.
O ponto de ruptura de algum cabo numa rede elétrica de pode ser modelado por uma variável aleatória com distribuição uniforme em . Neste caso, . A probabilidade de um determinado cabo se romper nos primeiros da rede é igual a . ∎
Distribuição exponencial
Dizemos que tem distribuição exponencial com parâmetro , denotado por , se sua função de distribuição for dada por
A distribuição exponencial se caracteriza pela propriedade conhecida por perda de memória,
para todos , ou seja, a variável esquece aquilo que já “viveu”.
Essa é a distribuição adequada para modelar o decaimento radioativo de átomos instáveis, bem como a vida útil de inúmeros materiais e objetos inanimados, como lâmpadas incandescentes ou óleos isolantes. Esses objetos deixam de funcionar não por envelhecimento ou deterioração ao longo do tempo, mas sim por um evento raro que ocorre independentemente da idade acumulada. A distribuição exponencial pode ser pensada como o limite de distribuições geométricas com pequenos intervalos de tempo. Isto é, se com muito grande, então a distribuição de se aproxima da distribuição exponencial com parâmetro .
Distribuição normal
Dizemos que a variável aleatória tem distribuição normal com parâmetros e , denotado por , se tem como densidade
O parâmetro é o valor central de , em torno do qual a distribuição é simétrica, e é relacionado à dispersão de em torno de sua média, dado pela distância entre o centro e os pontos de inflexão. Nos Capítulos 5 e 6 veremos que e são a “média” e o “desvio-padrão” de . Quando e , a distribuição é chamada normal padrão.
Exercício 3.28.
Mostre que se então a variável aleatória tem distribuição normal padrão. ∎
Sendo assim, podemos determinar a função de distribuição de uma variável normal qualquer se conhecermos a função de distribuição de uma normal padrão.
Como veremos ao longo deste livro, a distribuição normal tem um papel fundamental em probabilidade, de modo que com muita frequência precisamos determinar sua função de distribuição, ou seja determinar o valor da integral
A integral acima não pode ser expressa como composição de funções elementares. Sendo assim, devemos calcular a integral acima por outros métodos, sem apelar ao Teorema Fundamental do Cálculo. Valores aproximados para a função podem ser encontrados na tabela na página Tabela Normal.
Exemplo 3.29.
Seja , podemos determinar observando que tem distribuição normal padrão, logo
Apesar de não ser possível expressar a integral indefinida de como uma função elementar, podemos mostrar que a função é de fato uma densidade. Supondo que é uma normal padrão,
onde realizamos uma mudança de coordenadas cartesianas para polares. Para o caso , basta fazer a mudança de variáveis , para reduzirmos ao caso da normal padrão.
Outras distribuições absolutamente contínuas
Veremos agora outras distribuições absolutamente contínuas de grande importância em aplicações, e que aparecerão em alguns exemplos e exercícios ao longo do livro.
Dizemos que tem distribuição Gama com parâmetros e , notação , se admite função densidade dada por
onde .
Dizemos que tem distribuição de Cauchy com parâmetros e , notação , se possui densidade dada por
Dizemos que tem distribuição de Laplace com parâmetros e , notação , se possui densidade dada por
Dizemos que uma tem distribuição de Gumbel se sua função de distribuição é dada por
Dizemos que tem distribuição Beta com parâmetros , notação , se possui densidade dada por
onde .