12.3 Amostragem opcional
Se é um martingale, então para todo . Ou seja, se a sequência representa os ganhos em um jogo justo, o valor médio deve ser preservado ao longo das rodadas. Porém se é um tempo aleatório, pense por exemplo em como sendo o tempo em que o martingale atinge seu máximo, muito provavelmente . Isso também é natural, pois neste caso precisamos de informação acerca do futuro para determinar quando estamos passando pelo tempo . Mas e se for um tempo de parada, será que poderíamos afirmar que ?
Exemplo 12.22 (O sistema de apostas chamado Martingale).
Seja uma sequência de variáveis i.i.d. com e considere sua filtração natural. Tome para todo . O martingale reflete o ganho acumulado de um jogador que aposta nos vermelhos, em um jogo de roleta justo,2121 21 Em um jogo de roleta justo, que não existe na prática, os vermelhos e pretos têm chance , isto é, não existem as casas verdes 0 e 00. e vai dobrando o valor apostado. Seja , isto é, é a rodada em que o jogador ganha pela primeira vez, recuperando todas as perdas anteriores e ainda tirando de lucro. Neste caso, q.c. e , logo . Veja que essa estratégia exige que o jogador tenha um capital (ou crédito) infinito.2222 22 Há muitos relatos de apostadores que começaram com um grande capital e, depois de um longo período de lucro obtido com a aplicação sistemática dessa estratégia, terminaram perdendo todo o lucro e mais o capital que haviam levado consigo. ∎
Portanto, queremos saber sob quais hipóteses a propriedade de ser martingale ou supermartingale é preservada quando o processo é observado em um tempo de parada . O teorema a seguir nos fornece vários critérios que asseguram essa propriedade.
Teorema 12.23 (Teorema da Amostragem Opcional).
Sejam um supermartingale e um tempo de parada finito. Então se pelo uma das condições abaixo for satisfeita para algum :
-
(1)
q.c.;
-
(2)
q.c. para todo ;
-
(3)
q.c. para todo e ;
-
(4)
q.c. para todo .
Em particular, se é um martingale e vale alguma das três primeiras condições acima, então .
Demonstração.
Usando o Teorema do Martingale Parado, . Supondo (1), basta tomar algum para ter . Para os outros casos, observe que, como é finito, q.c. Supondo (4), temos que diretamente pelo Lema de Fatou.
Podemos ver que o Exemplo 12.22 viola cada uma das hipóteses acima:
-
•
O tempo de parada não é limitado.
-
•
O lucro (ou prejuízo!) acumulado não é limitado.
-
•
No evento , temos que , portanto não é limitado.
-
•
O lucro acumulado pode tomar valores negativos.
Exemplo 12.24 (Problema da ruína do apostador).
Considere o passeio aleatório começando de . Seja fixo e suponha que . Defina o tempo de parada , e observe que q.c. (exercício!). Queremos calcular , isto é, a probabilidade de que um passeio aleatório, começando em , chegue a antes de .
Podemos interpretar este exemplo como um jogador que dispõe de um capital inicial e tem como adversário um outro jogador cujo capital inicial é de . Em cada rodada o primeiro jogador ganha com probabilidade e com probabilidade , até que um dos dois perca todo o capital.
Consideramos primeiro o caso , em que é um martingale. Como é limitado, pelo Teorema da Amostragem Opcional,
Portanto para todo .
No caso , observamos que a sequência definida por é um martingale com respeito à mesma filtração. Tirar um martingale do chapéu é uma técnica muito comum em Probabilidade! Usando-se novamente Teorema da Amostragem Opcional, obtemos
e, resolvendo,
para todo . ∎
O teorema abaixo é uma interessante aplicação do Teorema da Amostragem Opcional e generaliza o Exemplo 11.24, que diz que sob certas condições a média da soma de uma quantidade aleatória de parcelas aleatórias é a média das parcelas vezes o número médio de parcelas.
Teorema 12.25 (Identidade de Wald).
Seja uma sequência de variáveis aleatórias independentes, integráveis e com a mesma esperança. Seja um tempo de parada integrável com respeito à filtração natural de . Então
Demonstração.
Definindo , temos que é martingale e satisfaz
Pelo Teorema da Amostragem Opcional, , portanto
o que conclui a prova. ∎
Exemplo 12.26 (Tempo médio de retorno do passeio aleatório).
No passeio aleatório simétrico, definia o tempo de parada . Vamos mostrar que . Sabe-se que (será mostrado na próxima seção, e se fosse falso teríamos trivialmente). Se fosse integrável, teríamos pela identidade de Wald. Como q.c., podemos concluir que . ∎