7.4 Mais sobre a convergência em distribuição
Nesta seção faremos um estudo mais profundo da convergência em distribuição. Os teoremas aqui contidos são de natureza mais técnica e serão usados nas Seções 9.3, 9.4 e 10.3.
O lema abaixo nos fornece uma informação interessante sobre o conjunto dos pontos de descontinuidade de funções monótonas, em particular vale para funções de distribuição.
Lema 7.37.
O conjunto dos pontos de descontinuidade de qualquer função monótona , onde é um intervalo não-degenerado da reta, é enumerável. Em particular, qualquer intervalo não-degenerado contém pontos onde é contínua.
Demonstração.
Tome uma sequência de intervalos fechados , tais que quando . Suponhamos que seja não-decrescente; o caso não-crescente é totalmente análogo. Defina , o conjunto dos pontos de descontinuidade de , e para todo . Temos que , logo é finito. Como , segue que é enumerável, pois é união enumerável de conjuntos enumeráveis. Por outro lado, pelo Corolário A.13, intervalos não-degenerados não são enumeráveis, portanto eles devem conter pontos de continuidade de . ∎
Proposição 7.38 (Unicidade do limite em distribuição).
O limite em distribuição é único, isto é, se e então .
Demonstração.
Sejam e as funções de distribuição de e , e seus respectivos pontos de descontinuidade. Por hipótese, e para todo , logo . Pelo Lema 7.37, é enumerável, logo para todo , existem tais que . Como e são contínuas à direita,
Portanto . ∎
Conforme vimos na seção anterior, a convergência em distribuição é a mais fraca de todas, enquanto a convergência quase certa é uma das mais fortes. Sendo assim, o próximo teorema é um tanto surpreendente, pois nos garante que quando há a convergência em distribuição de uma sequência de variáveis aleatórias para uma outra variável limite, existem cópias com as mesmas distribuições da sequência original e da variável limite para as quais a convergência é quase certa.
Teorema 7.39 (Acoplamento de Skorokhod).
Se , então existe um espaço de probabilidade onde estão definidas variáveis aleatórias e tais que para todo , , e .
Demonstração.
Usaremos a função quantil definida na Seção 3.1.3 como
que permite construir uma variável aleatória com a distribuição desejada a partir de uma uniforme , tomando-se Para construir as variáveis aleatórias como no enunciado do teorema, usaremos uma mesma variável aleatória para todas as . Isto é, tomamos Vamos mostrar que para todo ponto de continuidade de . Pelo Lema 7.37, os pontos de descontinuidade de são enumeráveis, logo concluindo a prova.
Seja ponto de continuidade de , e seja . Defina . Por continuidade, existem e tais que e . Pelo Lema 7.37, existem e pontos de continuidade de tais que . Observe que , onde na primeira e última desigualdades utilizamos (3.15). Como e , segue que para todo suficientemente grande. Por (3.15), esta última desigualdade implica que . Portanto, , que é o que queríamos mostrar. ∎
Com o acoplamento de Skorokhod, estamos aptos a provar de modo simples um critério para convergência em distribuição. Esse critério será usado na demonstração do Teorema do Limite Central que veremos no Capítulo 9.
Teorema 7.40 (Teorema de Helly-Bray).
Sejam e variáveis aleatórias definidas em um mesmo espaço de probabilidade. São equivalentes:
-
-
para toda função contínua e limitada.
-
para toda função tal que são contínuas e limitadas.
Demonstração.
Começamos por . Suponha e seja contínua e limitada. Pelo acoplamento de Skorokhod, existem e tais que . Como é contínua, . Como é limitada, podemos aplicar o Teorema da Convergência Dominada, obtendo
Agora suponha . Seja um ponto de continuidade de , e seja . Tome tal que e uma função tal que são contínuas e limitadas, para todo e para todo (por exemplo, há um polinômio apropriado de grau em ). Então
Como isso vale para todo , concluímos que . De forma análoga (trocando por , e invertendo as desigualdades), podemos obter , o que prova . ∎
Observamos que em alguns textos a afirmação do item do teorema acima é tomada como a definição de convergência em distribuição. Isto permite estender a definição de convergência em distribuição para outros contextos, como, por exemplo, para vetores aleatórios.
Outra observação é que o requisito de tomarmos até a derivada terceira no teorema acima não tem nada de especial. Poderíamos tê-lo feito considerando derivadas até uma determinada ordem . Escolhemos derivada terceira porque será suficiente quando provarmos as versões dos Teoremas do Limite Central de Lyapunov e de Lindeberg nas Seções 9.3 e 9.4.