Função característica
Do ponto de vista teórico, a função característica é bem mais robusta e
funcional que a função geradora de momentos:
está definida para qualquer distribuição;
sempre determina a distribuição;
determina também a convergência em distribuição;
não bastasse, ainda gera momentos.
Entretanto, a função característica envolve a manipulação de números complexos.
Ressaltamos, porém, que o estudo de funções características não requer conhecimentos de cálculo em uma variável complexa.
Isso porque as integrais são calculadas em para e não em para caminhos .
(Variável aleatória complexa).
Uma variável aleatória complexa é uma função tal
que , onde e são variáveis aleatórias reais.
Se e são integráveis, dizemos que é integrável e definimos
A integração de funções complexas em domínios reais pode ser feita, para todos
os fins práticos, como no caso real.
Ou seja, se satisfaz para , então
(10.15)
Vamos utilizar a fórmula de Euler, que define
para .
Usaremos sem demonstração os seguintes fatos:
onde .
.
Se e são variáveis aleatórias complexas integráveis, então é integrável com , e para tem-se integrável com .
Se, além disso, e são independentes, então é integrável com .
Demonstração.
Sejam , com , e com e variáveis aleatórias reais integráveis.
Observe que e .
Logo, a integrabilidade de e segue da integrabilidade de suas respectivas partes real e imaginária.
Portanto,
e
Se e são independentes, então e são independentes. Logo
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onde a hipótese de independência foi usada na segunda igualdade.
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.
Se , então é integrável e .
Demonstração.
Escreva .
Como e , segue que e são integráveis, logo é integrável.
Se , então .
No caso geral, escrevemos , com , de forma que
e, pelo caso anterior,
.
∎
A seguir definiremos a função característica de uma variável aleatória.
(Função característica).
A função característica de uma variável aleatória , denotada por
, é a função definida como
Observe que a função característica de uma variável aleatória depende de fato apenas de sua distribuição.
Quando a variável for absolutamente contínua com função densidade , sua função característica é simplesmente a transformada de Fourier da função .
(Uniforme).
Se , então
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Ou, usando (10.15):
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(Poisson).
Se , então:
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(Geométrica).
Se , então
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.
Para todo , vale .
Além disso, .
Ademais, para .
Demonstração.
Basta observar que
e
(Independência).
Se e são independentes, então
para todo .
Demonstração.
Observe que, se e são independentes, então e também o são. Logo podemos escrever
onde a independência foi utilizada na última igualdade.
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(Cálculo de Momentos).
Se , então tem -ésima derivada, e ademais
Demonstração.
Assim como fizemos para a função geradora de momentos, gostaríamos de derivar dentro da esperança de modo que possamos escrever
(10.26)
obtendo assim .
Vamos mostrar, por indução em , que, se , então vale (10.26) para todo .
O caso é trivial. Suponha que a afirmação vale para algum , e seja tal que .
Observe que , pois , logo vale (10.26).
Defina .
Observe que
e este último é integrável por hipótese.
Pelo Teorema 5.49,
para todo , o que conclui a prova por indução.
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(Normal).
Se , então
.
Usando (10.26),
podemos derivar dentro da integral, e integrando por partes obtemos
As soluções da equação
são dadas por , com .
Avaliando no ponto , obtemos , como anunciado acima.
Ademais, se , então pela Proposição 10.23.
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(Expansão de Taylor).
Se , então
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onde o resto satisfaz
quando .
Demonstração.
Imediato da Proposição 10.25 e Teorema A.6.
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(Poisson).
Calculando os momentos da Poisson:
,
,
.
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Outra grande utilidade da função característica é que permite determinar a distribuição de determinada variável aleatória. Enunciaremos agora este fato, mas sua prova será dada na seção seguinte.
(Teorema da Unicidade).
Se duas variáveis aleatórias têm a mesma função característica, então têm a mesma distribuição.
(Soma de variáveis Poisson independentes).
Se e são independentes,
então
onde .
Portanto, .
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A seguir enunciaremos uma versão simplificada do mais importante teorema deste capítulo, o Teorema da Continuidade de Lévy, que relaciona convergência de funções características com
a convergência em distribuição estudada no Capítulo 7.
Daremos alguns exemplos de sua grande aplicabilidade.
Na Seção 10.3, enunciaremos e provaremos uma versão um pouco mais geral que a enunciada abaixo.
(Teorema da Continuidade de Lévy).
Sejam e variáveis aleatórias.
Então
converge em distribuição para
se, e somente se,
para todo
Como exemplos da força do Teorema da Continuidade, forneceremos novas provas da convergência de binomial a Poisson, da Lei Fraca dos Grandes Números e do Teorema do Limite Central para o caso i.i.d.
(Binomial Converge para Poisson).
Seja e para considere .
Então
Com efeito,
analisando a função característica das obtemos
,
onde
.
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(Lei Fraca dos Grandes Números para o caso i.i.d.).
Faremos uma demonstração curta do Teorema 8.3.
Como as são i.i.d.,
onde é tal que quando .
Segue que quando ,
para todo .
Pelo Teorema da Continuidade de Lévy, .
Como é constante, segue da Proposição 7.36 que .
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(Teorema do Limite Central).
Faremos uma demonstração curta do Teorema 9.1.
Supomos sem perda de generalidade que .
Como as são i.i.d.,
onde é tal que quando .
Segue que
quando , para todo .
Como é a função característica de uma normal padrão (Exemplo 10.27), pelo Teorema da Continuidade de Lévy, segue que .
∎