5.
Seja \(f(x,y)=\begin{cases}
\dfrac{x^3}{x^2+y^2},&(x,y)\neq(0,0)\\
\hfill 0,&(x,y)=(0,0).
\end{cases}\)
- Mostre que \(f\) é contínua em \((0,0)\text{.}\)
- Calcule \(\dfrac{\partial f}{\partial x}(0,0)\) e \(\dfrac{\partial f}{\partial y}(0,0)\text{.}\)
- \(f\) é diferenciável em \((0,0)\text{?}\)
- \(\dfrac{\partial f}{\partial x}\) e \(\dfrac{\partial f}{\partial y}\) são contínuas em \((0,0)\text{?}\)
Dica.
Siga com o Corolário A.3.7 no primeiro item e pela definição em cada item seguinte.
Resposta.
- Seguindo a dica é fácil.
- \(\dfrac{\partial f}{\partial x}(0,0)=1\) e \(\dfrac{\partial f}{\partial y}(0,0)=0\text{.}\)
- Não.
- Não.
Solução.
- Para mostrar que \(f\) é contínua em \((0,0)\text{,}\) precisamos verificar que \(\lim\limits_{(x,y)\to (0,0)} f(x,y)=f(0,0)\text{.}\) De fato,\begin{equation*} \lim\limits_{(x,y)\to (0,0)} f(x,y)= \lim\limits_{(x,y)\to (0,0)}\dfrac{x^3}{x^2+y^2}= \lim\limits_{(x,y)\to (0,0)}x\cdot\dfrac{x^2}{x^2+y^2}\stackrel{(\ast)}{=}0=f(0,0). \end{equation*}Logo, \(f\) é contínua em \((0,0)\text{.}\) A igualdade \((\ast)\) segue da aplicação do Corolário A.3.7.
- Vamos seguir pela definição, já que não é possível aplicar as regras de derivação no ponto em questão (o denominador se anula ali):\begin{align*} \dfrac{\partial f}{\partial x}(0,0)&=\lim\limits_{h\to 0}\dfrac{f(0+h,0)-f(0,0)}{h} =\lim\limits_{h\to 0}\dfrac{\dfrac{h^3}{h^2+0^2}-0}{h}=1;\\ \dfrac{\partial f}{\partial y}(0,0)&=\lim\limits_{k\to 0}\dfrac{f(0,0+k)-f(0,0)}{k} =\lim\limits_{k\to 0}\dfrac{0-0}{k}=0; \end{align*}
- Seguindo também pela definição, com \((x_0,y_0)=(0,0)\text{,}\) temos\begin{align*} \lim\limits_{(h,k)\to(0,0)} &\dfrac{f(h,k)-f(0,0)-f_x(0,0)h-f_y(0,0)k} {\sqrt{h^2+k^2}}\\ & =\lim\limits_{(h,k)\to(0,0)} \dfrac{\dfrac{h^3}{h^2+k^2}-h}{\sqrt{h^2+k^2}}= \lim\limits_{(h,k)\to(0,0)} -\dfrac{k^2}{(h^2+k^2)}\dfrac{k}{\sqrt{h^2+k^2}}, \end{align*}que não existe. Para verificar isso, observe que o limite acima não existe (laterais distintos) ao longo da curva \(\gamma(t)=(t,t)\text{,}\) conforme o Teorema A.3.8.
- Para verificar a continuidade de qualquer função num ponto, precisamos do seu valor no ponto e numa vizinhança desse ponto. Os valores de \(f_x(0,0)\) e \(f_y(0,0)\) foram calculados no segundo item. Fora da origem podemos aplicar as regras derivação. Obtemos então\begin{align*} f_x(x,y)=&\begin{cases} \dfrac{x^4+3x^2y^2}{(x^2+y^2)^2},& (x,y)\neq (0,0)\\ \hfill 0,& (x,y)=(0,0). \end{cases}\\ f_y(x,y)=&\begin{cases} \dfrac{-2x^3y}{(x^2+y^2)^2},& (x,y)\neq (0,0)\\ \hfill 0,& (x,y)=(0,0). \end{cases} \end{align*}A continuidade dessas funções se dará pela verificação de \(\lim\limits_{(x,y)\to (0,0)} f_x(x,y)=f_x(0,0)\) e \(\lim\limits_{(x,y)\to (0,0)} f_y(x,y)=f_y(0,0)\text{.}\) Nenhuma das duas condições é verdadeira, vamos fazer apenas a primeira. Usando mais uma vez o Teorema A.3.8, com \(\gamma_1(t)=(t,0)\) e \(\gamma_2(t)=(0,t)\text{,}\) temos\begin{align*} \lim\limits_{t\to 0} f_x\big(\gamma_1(t)\big) &=\lim\limits_{t\to 0}\dfrac{t^4}{t^4}=1\\ \lim\limits_{t\to 0} f_x\big(\gamma_2(t)\big) &=\lim\limits_{t\to 0}\dfrac{0}{t^4}=0. \end{align*}Verifique também que a derivada parcial em \(y\) não é contínua na origem.
Nota 1.5.1.
Neste exemplo, o candidato natural a plano tangente ao gráfico de \(f\) em \(\big(0,0,f(0,0)\big)=(0,0,0)\) é \(\pi\colon z=x\text{.}\) É esperado que tal plano contenha todos os vetores tangentes a curvas deriváveis contidas no gráfico de \(f\text{,}\) passando pela origem. Tais curvas são da forma \(\Gamma(t)=\Big(x(t),y(t),f\big(x(t),y(t)\big)\Big)\text{,}\) com \(t\in I\) e com algum \(t_0\in I\) tal que \(x(t_0)=y(t_0)=0\text{.}\) Considere, então
\begin{equation*}
\Gamma(t)=\big(t,t,f(t,t)\big)=(t,t,t/2),\quad t\in\R.
\end{equation*}
É fácil ver que \(\Gamma(0)=(0,0,0)\text{,}\) mas \(\Gamma'(0)=(1,1,\frac{1}{2})\not\in\pi\text{.}\) Veja na figura como o plano aproxima bem o gráfico da função ao longos dos eixos, mas não sobre a curva: